O dia 9 de dezembro (amanhã), é o Dia Mundial de Combate à Corrupção. Para marcar a data, o MCCE preparou um dia de intensa mobilização com programações pela manhã e pela tarde na Câmara dos Deputados. Segue:
Manhã
10h - Concentração de membros do MCCE e apoiadores da Campanha Ficha Limpa no Salão Verde do Congresso Nacional.
11h - Visita à presidência da Câmara para protocolar Carta do MCCE, com pedido de apoio ao PLP 518/09, assinada pelos presentes. Em seguida, sairemos em visita à Rádio e TV Câmara e ao Comitê de Imprensa da Casa.
Tarde
14:30h - Concentração no Salão Verde do Congresso Nacional.
15h - Visita aos gabinetes dos líderes partidários para entrega da Carta do MCCE, com pedido de apoio ao PLP 518/09.
16h - Entrega de mais de 200 mil assinaturas em apoio à Ficha Limpa, enviadas ao MCCE por todo o país. Na ocasião, membros do MCCE e apoiadores da Campanha Ficha Limpa se juntarão à mobilização da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção da Câmara.
terça-feira, 8 de dezembro de 2009
sábado, 3 de outubro de 2009
Ficha limpa: “O principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas”. Entrevista especial com Marlon Reis
“Não faz sentido o que diz a legislação hoje, pois ela abre as portas da política para criminosos”, reforça o juiz eleitoral.
Confira a entrevista.
O projeto Ficha Limpa, que está agora sob a análise da Câmara dos Deputados, visa melhorar o perfil dos candidatos e candidatas a cargos eletivos do país. Se for aprovada, vira lei e, com isso, barra as possíveis candidaturas de políticos que tenham, em sua ficha, delitos graves ou renunciaram para escapar de punições. Hoje, segundo o juiz Marlon Reis, “o principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas”, muitas delas, inclusive, ligadas a investimentos que deveriam ser feitos nas áreas da saúde e educação. Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, Reis, que faz parte do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, disse que acredita que o projeto vai ser sim aprovado, mas receia que, durante as análises dos deputados e senadores, sejam fixados critérios ou padrões que não representem um ganho efetivo para garantir a qualidade e honestidade do processo eleitoral.
Marlon Reis é natural do Maranhão. Atua como juiz eleitoral. É também presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe).
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O Congresso deve aprovar a lei da Ficha Limpa?
Marlon Reis – Eu não tenho dúvida de que vai aprovar. Nosso receio é de que eles fixem critérios e padrões inaceitáveis que, mesmo modificando a legislação atual, o projeto, então, não represente um ganho efetivo para a lisura do processo eleitoral.
IHU On-Line – Que mudanças podem indicar?
Marlon Reis – Alguns parlamentares falaram da necessidade de confirmação dessa decisão por outra instancia. Eu não concordo, pois isso gera uma morosidade que não vai representar nada para a sociedade. Agora, outros parlamentares têm falado que a decisão tem a necessidade da presença de um colegiado. Isso não podemos considerar um absurdo, mas nossa proposta é de que haja uma definição no âmbito de qualquer instancia do poder judiciário.
IHU On-Line – Quais as peculiaridades desse projeto?
Marlon Reis – O principal é que ele estabelece restrição às candidaturas de pessoas já condenadas pela Justiça por crimes graves, tais como estupro, desvio de verbas, tráfico de drogas e outros grandes delitos. E também impede a candidatura de pessoas que renunciaram para escapar de punições. Isso é muito comum e, segundo o projeto, essas pessoas se tornam inelegíveis por oito anos.
IHU On-Line – Se essa lei entrasse em vigor agora, quem poderia ser cassado?
Marlon Reis – Essa lei vai atingir todos aqueles que tiverem graves pendências com condenações na Justiça. Então, esse é um número impossível de explicitar. Entre os parlamentares, existem algumas pesquisas que revelam que não seria tão alto o número porque infelizmente os nossos tribunais andam muito lentamente. Mas, em compensação, há um grande número de pessoas condenadas por compra de votos, abuso de poder, desvio de verbas, falta de prestação de contas. É impossível precisar, mas o número é muito grande de pessoas que ficará de fora das eleições quando a nossa lei for aprovada.
IHU On-Line – O senhor saber dizer qual é o perfil dos políticos com “ficha suja” e que hoje transitam normalmente pelos ambientes da política brasileira?
Marlon Reis – O principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas. Infelizmente, isso é algo quase comum e aceito com uma naturalidade impressionante. Pessoas notoriamente envolvidas com desvios de verbas públicas, muitas vezes, de áreas como saúde e educação, estão aí desfilando nas colunas sociais como autoridades públicas.
IHU On-Line – Como juiz, o que esse projeto representa para a Justiça brasileira?
Marlon Reis – Representa um crescimento da igualdade. É preciso ter regras de fibra, regras que garantam a justiça no funcionamento de todos os poderes. Precisa aprimorar também o próprio Poder Judiciário, mas, certamente, os poderes públicos, cujos titulares são eleitos estão bastante atrasados na qualidade da seleção dos seus representantes.
IHU On-Line – Hoje, a legislação trata de alguma forma desse tema?
Marlon Reis – Hoje, a legislação é completamente leniente, é uma legislação que favorece a presença da política de pessoas corruptas, porque exige o trânsito em julgado dessas decisões. Mas isso não se aplica ao direito eleitoral. Então, não faz sentido o que diz a legislação hoje, pois ela abre as portas da política para criminosos.
IHU On-Line – Algumas pessoas que são contra esse projeto argumentam que o princípio da presunção de inocência do acusado contemplado no art. 5º da Constituição prevê a necessidade do trânsito em julgado da sentença judicial para a incidência da inelegibilidade. Como o senhor vê essa questão?
Marlon Reis – Essa é uma tese completamente equivocada. O principio da presunção da inocência só serve para impedir a aplicação de uma sentença criminal. Se considerarmos todo mundo inocente, a não ser que haja uma decisão condenatória penal transitando em julgado, daqui a pouco não vamos poder demitir por justa causa o empresário que atirou no seu patrão. Não se aplica a nenhum outro ramo do direito, só ao ramo penal. O direito eleitoral tem sua própria principiologia. O princípio que se espera é o princípio da precaução que está previsto na própria Constituição.
IHU On-Line – Por onde esse projeto terá que passar ainda até ser aprovado?
Marlon Reis – Bom, ele já está na Câmara, depois vai para o Senado e, depois, passa pela sanção presidencial. Nós acompanharemos cada passo para tentar garantir a maior brevidade possível. Não vamos permitir que esse projeto fique engavetado no Congresso Nacional.
Confira a entrevista.
O projeto Ficha Limpa, que está agora sob a análise da Câmara dos Deputados, visa melhorar o perfil dos candidatos e candidatas a cargos eletivos do país. Se for aprovada, vira lei e, com isso, barra as possíveis candidaturas de políticos que tenham, em sua ficha, delitos graves ou renunciaram para escapar de punições. Hoje, segundo o juiz Marlon Reis, “o principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas”, muitas delas, inclusive, ligadas a investimentos que deveriam ser feitos nas áreas da saúde e educação. Em entrevista à IHU On-Line, realizada por telefone, Reis, que faz parte do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, disse que acredita que o projeto vai ser sim aprovado, mas receia que, durante as análises dos deputados e senadores, sejam fixados critérios ou padrões que não representem um ganho efetivo para garantir a qualidade e honestidade do processo eleitoral.
Marlon Reis é natural do Maranhão. Atua como juiz eleitoral. É também presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe).
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O Congresso deve aprovar a lei da Ficha Limpa?
Marlon Reis – Eu não tenho dúvida de que vai aprovar. Nosso receio é de que eles fixem critérios e padrões inaceitáveis que, mesmo modificando a legislação atual, o projeto, então, não represente um ganho efetivo para a lisura do processo eleitoral.
IHU On-Line – Que mudanças podem indicar?
Marlon Reis – Alguns parlamentares falaram da necessidade de confirmação dessa decisão por outra instancia. Eu não concordo, pois isso gera uma morosidade que não vai representar nada para a sociedade. Agora, outros parlamentares têm falado que a decisão tem a necessidade da presença de um colegiado. Isso não podemos considerar um absurdo, mas nossa proposta é de que haja uma definição no âmbito de qualquer instancia do poder judiciário.
IHU On-Line – Quais as peculiaridades desse projeto?
Marlon Reis – O principal é que ele estabelece restrição às candidaturas de pessoas já condenadas pela Justiça por crimes graves, tais como estupro, desvio de verbas, tráfico de drogas e outros grandes delitos. E também impede a candidatura de pessoas que renunciaram para escapar de punições. Isso é muito comum e, segundo o projeto, essas pessoas se tornam inelegíveis por oito anos.
IHU On-Line – Se essa lei entrasse em vigor agora, quem poderia ser cassado?
Marlon Reis – Essa lei vai atingir todos aqueles que tiverem graves pendências com condenações na Justiça. Então, esse é um número impossível de explicitar. Entre os parlamentares, existem algumas pesquisas que revelam que não seria tão alto o número porque infelizmente os nossos tribunais andam muito lentamente. Mas, em compensação, há um grande número de pessoas condenadas por compra de votos, abuso de poder, desvio de verbas, falta de prestação de contas. É impossível precisar, mas o número é muito grande de pessoas que ficará de fora das eleições quando a nossa lei for aprovada.
IHU On-Line – O senhor saber dizer qual é o perfil dos políticos com “ficha suja” e que hoje transitam normalmente pelos ambientes da política brasileira?
Marlon Reis – O principal aspecto são as condenações reiteradas por desvio de verbas. Infelizmente, isso é algo quase comum e aceito com uma naturalidade impressionante. Pessoas notoriamente envolvidas com desvios de verbas públicas, muitas vezes, de áreas como saúde e educação, estão aí desfilando nas colunas sociais como autoridades públicas.
IHU On-Line – Como juiz, o que esse projeto representa para a Justiça brasileira?
Marlon Reis – Representa um crescimento da igualdade. É preciso ter regras de fibra, regras que garantam a justiça no funcionamento de todos os poderes. Precisa aprimorar também o próprio Poder Judiciário, mas, certamente, os poderes públicos, cujos titulares são eleitos estão bastante atrasados na qualidade da seleção dos seus representantes.
IHU On-Line – Hoje, a legislação trata de alguma forma desse tema?
Marlon Reis – Hoje, a legislação é completamente leniente, é uma legislação que favorece a presença da política de pessoas corruptas, porque exige o trânsito em julgado dessas decisões. Mas isso não se aplica ao direito eleitoral. Então, não faz sentido o que diz a legislação hoje, pois ela abre as portas da política para criminosos.
IHU On-Line – Algumas pessoas que são contra esse projeto argumentam que o princípio da presunção de inocência do acusado contemplado no art. 5º da Constituição prevê a necessidade do trânsito em julgado da sentença judicial para a incidência da inelegibilidade. Como o senhor vê essa questão?
Marlon Reis – Essa é uma tese completamente equivocada. O principio da presunção da inocência só serve para impedir a aplicação de uma sentença criminal. Se considerarmos todo mundo inocente, a não ser que haja uma decisão condenatória penal transitando em julgado, daqui a pouco não vamos poder demitir por justa causa o empresário que atirou no seu patrão. Não se aplica a nenhum outro ramo do direito, só ao ramo penal. O direito eleitoral tem sua própria principiologia. O princípio que se espera é o princípio da precaução que está previsto na própria Constituição.
IHU On-Line – Por onde esse projeto terá que passar ainda até ser aprovado?
Marlon Reis – Bom, ele já está na Câmara, depois vai para o Senado e, depois, passa pela sanção presidencial. Nós acompanharemos cada passo para tentar garantir a maior brevidade possível. Não vamos permitir que esse projeto fique engavetado no Congresso Nacional.
terça-feira, 15 de setembro de 2009
Questionamento e resposta sobre o PL de Iniciativa Popular sobre a Vida Pregressa dos Candidatos
Caros amigos do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE
Sou formado em direito, estou cursando a Faculdade de Filosofia e faço estágio em uma escola privada na cidade de Jaboticabal.
O professor de Filosofia da escola que eu faço estágio divulgou a honrosa campanha “Ficha Limpa” organizado por vocês.
Ocorre que me surgiram algumas duvidas:
Uma das mudanças que vocês propõe na “Lei das Inelegibilidades” é “Pessoas condenadas em primeira ou única instância ou com denúncia recebida por um tribunal – no caso de políticos com foro privilegiado – em virtude de crimes graves como: racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas. Essas pessoas devem ser preventivamente afastadas das eleições ate que resolvam seus problemas com a Justiça Criminal;”. Ocorre que essa mudança na legislação não seria considerada inconstitucional uma vez que a Constituição Federal tem vários dispositivos que podem ser usados para argüir a inconstitucionalidade dessa lei caso ela seja aprovada? Exempo:
No que tange a “condenação em primeira instância” para uma pessoa ser considerada inelegível a Constituição da o direito ao duplo grau de jurisdição (“Art. 5º, LV CF - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”). A favor de quem foi “condenado em primeira instância” ainda tem o Art. 15 CF – “É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;”;
No que refere-se “denúncia recebida por um tribunal – no caso de políticos com foro privilegiado” esse dispositivo fere o direito ao contraditório e a ampla defesa (Art. 5º, LV CF);
Outra mudança seria “tornar mais rápidos os processos judiciais sobre abuso de poder nas eleições, fazendo com que as decisões sejam executadas imediatamente, mesmo que ainda caibam recursos.” Nesse caso a inconstitucionalidade pode ser argüida com base nos art. 5, LV CF (direito ao duplo grau de jurisdição).
Tenho ciência da existência do Art. 14 CF- “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”, mas essa lei complementar, que prevê esse artigo, pode ir contra os direitos assegurados pela constituição?
Não sou contra a esse projeto de lei por iniciativa popular, mas acredito que o exposto acima pode ser usado por políticos que venham a ficar inelegíveis e provocar o Supremo Tribunal Federal a manifestar-se sobre a constitucionalidade dessa lei.
Não sei se é possível, mas uma saída poderia ser um projeto de Emenda Constitucional e não a alteração na Lei de Inelegibilidades.
No aguardo de um esclarecimento.
Gustavo Pozzi
***
Resposta de Márlon Reis:
Caro Gustavo Pozzi,
Fiquei feliz com a oportunidade de dialogar com você acerca das inteligentes indagações que apresenta. Tentarei tratar de cada uma. Antes, porém, gostaria de falar sobre as bases da reflexão jurídica que levou à elaboração do projeto.
O Direito Eleitoral sempre foi relegado a um plano inferior na nossa cultura jurídica. Princípios advindos de outros ramos do saber jurídico sempre o influenciaram marcantemente. Adotou-se durante muito tempo em termos procedimentais, por exemplo, regras típicas do Direito Processual Civil, sendo o sinal mais gritante disso a utilização do rito ordinário comum para a tramitação de certos feitos eleitorais.
Ocorre que o Direito Eleitoral é antes de tudo o Direito da Democracia. É talvez a mais basilar das matérias do Direito Público, de cuja correta interpretação depende a própria saúde das instituições políticas. Ele se orienta por princípios constitucionais próprios, que o notabilizam como ramo autônomo das ciências jurídicas.
O projeto foi elaborado por juristas que tiveram isso sempre em conta. Esperamos estar colaborando para uma revisão hermenêutica que coloque o Direito Eleitoral no plano que merece, livrando-o a adoção mecanicista de principiologias criadas para informar outros campos do Direito.
Então vamos às respostas:
1. No que tange a “condenação em primeira instância” para uma pessoa ser considerada inelegível a Constituição dá o direito ao duplo grau de jurisdição (“Art. 5º, LV CF - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”). A favor de quem foi “condenado em primeira instância” ainda tem o Art. 15 CF – “É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeito”;
O projeto não nega aplicabilidade aos princípios da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, da CF). Isso ocorreria se estivéssemos propondo que após uma condenação criminal o sentenciado ficasse privado do acesso à revisão do julgado, mas não é o que se dá. O direito à amplitude de defesa e ao contraditório seguirão sendo exercidos no âmbito do processo criminal onde se proferiu a sentença condenatória, o que não impede que isso surta efeitos na esfera eleitoral. Veja que fora do Direito Penal é muito comum que as sentenças judiciais, mesmo sem trânsito em julgado, já surtam diversos efeitos. No âmbito civil, a propósito, é a possível a execução provisória dos julgados em diversas matérias elencadas no art. 520 do CPC. No mandado de segurança a sentença é deve ser desde logo cumprida (Art. 13 da Nova Lei do Mandado de Segurança Individual e Coletivo). Poderia citar muitos outros exemplos em que o direito autoriza a adoção de providências judiciais antes do trânsito em julgado. Isso em nada afeta a ampla defesa e o contraditório, que continuam podendo ser exercitados até o final do processo, buscando a parte a eventual reversão do ato decisório.
A concessão de eficácia executiva imediata ao julgado é uma escolha do legislador, que nada se opõe à continuidade do feito com a observância do direito de defesa em sua máxima amplitude.
Quanto ao art. 15, III, da CF, o que afasta a sua incidência no caso concreto é o simples fato de que o projeto não propõe a cassação de direitos políticos, nem sua perda ou suspensão. A imposição de uma inelegibilidade não se confunde com a perda ou a suspensão de direitos políticos. Se assim fosse não seria possível definirem-se outras hipóteses de afastamento da elegibilidade que não as relacionadas exaustivamente no referido art. 15 da CF. As inelegibilidades estão previstas em outro dispositivo da CF, o art. 14. Ali há algumas inelegibilidades definidas...
Leia a resposta de Márlon Reis na íntegra em http://docs.google.com/View?id=dgx3c728_1126xxjtfcp .
***
Retorno de Gustavo Pozzi:
Caros amigos do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE
Em primeiro lugar gostaria de agradecer a rápida resposta aos meus questionamentos. Desde já quero deixar claro que sou favorável a regulamentação desse projeto, acredito ainda que o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE, após vencida essa etapa de aprovação do projeto, poderia iniciar uma campanha para que seja discutida uma proposta de lei para a reforma política no Brasil.
Quanto à publicação dos meus questionamentos serem divulgados no blog, estão autorizados a fazer a publicação.
Um abraço
Gustavo Pozzi
Sou formado em direito, estou cursando a Faculdade de Filosofia e faço estágio em uma escola privada na cidade de Jaboticabal.
O professor de Filosofia da escola que eu faço estágio divulgou a honrosa campanha “Ficha Limpa” organizado por vocês.
Ocorre que me surgiram algumas duvidas:
Uma das mudanças que vocês propõe na “Lei das Inelegibilidades” é “Pessoas condenadas em primeira ou única instância ou com denúncia recebida por um tribunal – no caso de políticos com foro privilegiado – em virtude de crimes graves como: racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas. Essas pessoas devem ser preventivamente afastadas das eleições ate que resolvam seus problemas com a Justiça Criminal;”. Ocorre que essa mudança na legislação não seria considerada inconstitucional uma vez que a Constituição Federal tem vários dispositivos que podem ser usados para argüir a inconstitucionalidade dessa lei caso ela seja aprovada? Exempo:
No que tange a “condenação em primeira instância” para uma pessoa ser considerada inelegível a Constituição da o direito ao duplo grau de jurisdição (“Art. 5º, LV CF - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”). A favor de quem foi “condenado em primeira instância” ainda tem o Art. 15 CF – “É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos;”;
No que refere-se “denúncia recebida por um tribunal – no caso de políticos com foro privilegiado” esse dispositivo fere o direito ao contraditório e a ampla defesa (Art. 5º, LV CF);
Outra mudança seria “tornar mais rápidos os processos judiciais sobre abuso de poder nas eleições, fazendo com que as decisões sejam executadas imediatamente, mesmo que ainda caibam recursos.” Nesse caso a inconstitucionalidade pode ser argüida com base nos art. 5, LV CF (direito ao duplo grau de jurisdição).
Tenho ciência da existência do Art. 14 CF- “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: § 9º - Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta.”, mas essa lei complementar, que prevê esse artigo, pode ir contra os direitos assegurados pela constituição?
Não sou contra a esse projeto de lei por iniciativa popular, mas acredito que o exposto acima pode ser usado por políticos que venham a ficar inelegíveis e provocar o Supremo Tribunal Federal a manifestar-se sobre a constitucionalidade dessa lei.
Não sei se é possível, mas uma saída poderia ser um projeto de Emenda Constitucional e não a alteração na Lei de Inelegibilidades.
No aguardo de um esclarecimento.
Gustavo Pozzi
***
Resposta de Márlon Reis:
Caro Gustavo Pozzi,
Fiquei feliz com a oportunidade de dialogar com você acerca das inteligentes indagações que apresenta. Tentarei tratar de cada uma. Antes, porém, gostaria de falar sobre as bases da reflexão jurídica que levou à elaboração do projeto.
O Direito Eleitoral sempre foi relegado a um plano inferior na nossa cultura jurídica. Princípios advindos de outros ramos do saber jurídico sempre o influenciaram marcantemente. Adotou-se durante muito tempo em termos procedimentais, por exemplo, regras típicas do Direito Processual Civil, sendo o sinal mais gritante disso a utilização do rito ordinário comum para a tramitação de certos feitos eleitorais.
Ocorre que o Direito Eleitoral é antes de tudo o Direito da Democracia. É talvez a mais basilar das matérias do Direito Público, de cuja correta interpretação depende a própria saúde das instituições políticas. Ele se orienta por princípios constitucionais próprios, que o notabilizam como ramo autônomo das ciências jurídicas.
O projeto foi elaborado por juristas que tiveram isso sempre em conta. Esperamos estar colaborando para uma revisão hermenêutica que coloque o Direito Eleitoral no plano que merece, livrando-o a adoção mecanicista de principiologias criadas para informar outros campos do Direito.
Então vamos às respostas:
1. No que tange a “condenação em primeira instância” para uma pessoa ser considerada inelegível a Constituição dá o direito ao duplo grau de jurisdição (“Art. 5º, LV CF - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”). A favor de quem foi “condenado em primeira instância” ainda tem o Art. 15 CF – “É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de: III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeito”;
O projeto não nega aplicabilidade aos princípios da ampla defesa e do contraditório (art. 5º, LV, da CF). Isso ocorreria se estivéssemos propondo que após uma condenação criminal o sentenciado ficasse privado do acesso à revisão do julgado, mas não é o que se dá. O direito à amplitude de defesa e ao contraditório seguirão sendo exercidos no âmbito do processo criminal onde se proferiu a sentença condenatória, o que não impede que isso surta efeitos na esfera eleitoral. Veja que fora do Direito Penal é muito comum que as sentenças judiciais, mesmo sem trânsito em julgado, já surtam diversos efeitos. No âmbito civil, a propósito, é a possível a execução provisória dos julgados em diversas matérias elencadas no art. 520 do CPC. No mandado de segurança a sentença é deve ser desde logo cumprida (Art. 13 da Nova Lei do Mandado de Segurança Individual e Coletivo). Poderia citar muitos outros exemplos em que o direito autoriza a adoção de providências judiciais antes do trânsito em julgado. Isso em nada afeta a ampla defesa e o contraditório, que continuam podendo ser exercitados até o final do processo, buscando a parte a eventual reversão do ato decisório.
A concessão de eficácia executiva imediata ao julgado é uma escolha do legislador, que nada se opõe à continuidade do feito com a observância do direito de defesa em sua máxima amplitude.
Quanto ao art. 15, III, da CF, o que afasta a sua incidência no caso concreto é o simples fato de que o projeto não propõe a cassação de direitos políticos, nem sua perda ou suspensão. A imposição de uma inelegibilidade não se confunde com a perda ou a suspensão de direitos políticos. Se assim fosse não seria possível definirem-se outras hipóteses de afastamento da elegibilidade que não as relacionadas exaustivamente no referido art. 15 da CF. As inelegibilidades estão previstas em outro dispositivo da CF, o art. 14. Ali há algumas inelegibilidades definidas...
Leia a resposta de Márlon Reis na íntegra em http://docs.google.com/View?id=dgx3c728_1126xxjtfcp .
***
Retorno de Gustavo Pozzi:
Caros amigos do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE
Em primeiro lugar gostaria de agradecer a rápida resposta aos meus questionamentos. Desde já quero deixar claro que sou favorável a regulamentação desse projeto, acredito ainda que o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral – MCCE, após vencida essa etapa de aprovação do projeto, poderia iniciar uma campanha para que seja discutida uma proposta de lei para a reforma política no Brasil.
Quanto à publicação dos meus questionamentos serem divulgados no blog, estão autorizados a fazer a publicação.
Um abraço
Gustavo Pozzi
segunda-feira, 24 de agosto de 2009
Belo Horizonte intensifica participação na Campanha Ficha Limpa
O Estado de Minas Gerais saiu na frente e é recordista em número de assinaturas coletadas para a Campanha Ficha Limpa.
A adesão dos mineiros é mais expressiva do que a registrada em São Paulo, maior colégio eleitoral do país. Mais de 1% do eleitorado de Minas, onde há 14,07 milhões de eleitores, já se mobilizou e participa da campanha, o que contabiliza mais de 163.000 pessoas – num grande esforço integrado de cada fiel e de cada paróquia.Agora, o arcebispo de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, lança um desafio para intensificar ainda mais a Campanha Ficha Limpa e a arquidiocese possa contribuir para se alcançar a meta nacional de 1,3 milhão.
Neste esforço final, o Vicariato para a Ação Social e Política organiza um mutirão para coletar assinaturas na Praça Sete, nos próximos dias 1, 2 e 3 de setembro, de 10 às 16 horas. Todo cidadão pode participar da Campanha Ficha Limpa e sua adesão é muito importante. Na arquidiocese de Belo Horizonte o setor responsável pela mobilização é o Vicariato Episcopal para Ação Social e Política. Para participar é simples: pegue os formulários no Vicariato e devolva-os preenchidos no mesmo local, ou nas paróquias. A ficha também está disponível no site www.mcce.org.br.
Faltam 300 mil assinaturas para atingir 1,3 milhão e emplacar a lei impedindo a candidatura de políticos com pendências na justiça. Em âmbito nacional a meta é totalizar um por cento do eleitorado, e assim atender às exigências da lei que regulamenta a apresentação de projetos de iniciativa popular.
O documento deve dar entrada imediatamente no Congresso para que a nova legislação entre em vigor nas eleições de 2010.
Fonte: Zenit.
A adesão dos mineiros é mais expressiva do que a registrada em São Paulo, maior colégio eleitoral do país. Mais de 1% do eleitorado de Minas, onde há 14,07 milhões de eleitores, já se mobilizou e participa da campanha, o que contabiliza mais de 163.000 pessoas – num grande esforço integrado de cada fiel e de cada paróquia.Agora, o arcebispo de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, lança um desafio para intensificar ainda mais a Campanha Ficha Limpa e a arquidiocese possa contribuir para se alcançar a meta nacional de 1,3 milhão.
Neste esforço final, o Vicariato para a Ação Social e Política organiza um mutirão para coletar assinaturas na Praça Sete, nos próximos dias 1, 2 e 3 de setembro, de 10 às 16 horas. Todo cidadão pode participar da Campanha Ficha Limpa e sua adesão é muito importante. Na arquidiocese de Belo Horizonte o setor responsável pela mobilização é o Vicariato Episcopal para Ação Social e Política. Para participar é simples: pegue os formulários no Vicariato e devolva-os preenchidos no mesmo local, ou nas paróquias. A ficha também está disponível no site www.mcce.org.br.
Faltam 300 mil assinaturas para atingir 1,3 milhão e emplacar a lei impedindo a candidatura de políticos com pendências na justiça. Em âmbito nacional a meta é totalizar um por cento do eleitorado, e assim atender às exigências da lei que regulamenta a apresentação de projetos de iniciativa popular.
O documento deve dar entrada imediatamente no Congresso para que a nova legislação entre em vigor nas eleições de 2010.
Fonte: Zenit.
terça-feira, 18 de agosto de 2009
Por que político pode ter ficha suja?
Autor: Ricardo Mendonça
Revista Época - 17/08/2009 (pg. 54)
Em campanha por 1,3 milhão de assinaturas, o juiz quer vetar candidatos com condenação criminal
Há dez anos, um grupo de entidades juntou 1 milhão de assinaturas (1% do eleitorado) a favor de uma lei mais severa sobre compra de votos. Foi a primeira lei de iniciativa popular levada ao Congresso. Aprovada em menos de 40 dias, virou o principal instrumento de combate à corrupção eleitoral. Desde 1999, já serviu para cassar mais de 700 mandatos. Agora, as mesmas entidades querem repetir a dose. Criaram a Campanha Ficha Limpa e já coletaram 1 milhão de assinaturas a favor de uma lei sobre a vida pregressa dos candidatos. A ideia é vetar a candidatura de quem tem condenação na Justiça, mesmo quando ainda cabe recurso. Desta vez, precisam de 1,3 milhão de assinaturas, já que o eleitorado cresceu. O juiz Márlon Reis é um dos coordenadores do movimento. Ele explica os objetivos do projeto.
ENTREVISTA – MÁRLON REIS
QUEM É
Juiz de Direito especializado em questões eleitorais e presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais
O QUE FAZ
É um dos coordenadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). Atualmente, faz curso de doutorado na Universidade de Zaragoza, na Espanha, sobre compra de votos em eleições
ÉPOCA – O que diz o projeto de lei sobre a vida pregressa dos candidatos?
Márlon Reis – Ele estabelece que deve ficar afastado do processo eleitoral o candidato que sofreu condenação em ação penal pública por crimes considerados graves, como homicídio, estupro, narcotráfico, entre outros. Também vale para crimes relacionados à administração pública, como desvio de verbas. Hoje, a pessoa pode ser candidata enquanto não for julgada pelo último tribunal. Pelo projeto, basta sentença de primeira instância para impedir a candidatura.
ÉPOCA – E quais são os crimes pouco graves que permitiriam a candidatura?
Reis – Crimes de menor potencial ofensivo, como desacato, injúria, resistência à ordem de autoridade. Além disso, estão de fora as ações penais privadas, aquelas em que um particular pode mover contra outro. É para evitar que alguém faça isso com a finalidade de tumultuar a candidatura do adversário.
ÉPOCA – Muitas sentenças de primeira instância são reformadas em tribunais superiores. Não é injusto vetar a candidatura de quem ainda pode ser absolvido?
Reis – Eu entendo que a sentença penal de primeira instância deve ter algum significado, não pode ser considerada irrelevante. A sentença deve, no mínimo, acender um sinal amarelo. Pretendemos apenas que ela sirva para limitar uma candidatura. Existe, sim, a possibilidade de ser reformada. Mas há também a possibilidade de uma absolvição ser reformada. E mesmo decisões do último tribunal podem ser incorretas. A mensagem do projeto é a seguinte: se você recebeu uma sentença condenatória, então resolva primeiro sua pendência criminal e depois volte para a vida pública.
”Há muitos parlamentares processados, mas o Supremo
Tribunal Federal nunca condenou ninguém”
ÉPOCA – Mas a restrição à candidatura, por si só, já não é uma pena?
Reis – Não. Isso não é uma punição, é apenas uma restrição. Será uma medida preventiva. A lei vai limitar alguns aspectos da vida política do indivíduo, mas em defesa da sociedade. A Constituição permite ao Congresso editar leis que estabeleçam casos de inelegibilidade. Como o Congresso não fez isso até hoje, estamos mobilizando a sociedade para que cobre do Congresso essa providência.
ÉPOCA – O projeto não fere o princípio da presunção da inocência?
Reis – Ninguém pode ser juiz se tiver ocorrências em sua vida pregressa. Ninguém pode ser vigia se tiver problemas no passado, pois a Polícia Federal organiza um cadastro dos vigias e elimina quem tem condenação em qualquer instância. A regra, aliás, serve para todo o setor público. Por que com os políticos deveria ser diferente? Por que político pode ter ficha suja? O princípio da presunção da inocência serve para que o acusado não receba uma pena em caráter definitivo antes de ser julgado. Ele se aplica no Direito Penal, mas não no âmbito administrativo. Se fosse aplicar ao extremo o princípio da presunção da inocência, poderíamos ter uma pessoa condenada em duas instâncias por narcotráfico passando num concurso da Polícia Federal. Mas isso não acontece, é lógico. A PF elimina antes.
ÉPOCA – Quem será atingido?
Reis – Acho que, principalmente, os prefeitos de pequenas cidades que desviaram verbas. Isso porque, nos pequenos municípios, os prefeitos deixam de ser meros gestores e atuam como ordenadores de despesas. Então eles são identificados nos processos judiciais.
ÉPOCA – E os deputados federais, senadores, governadores?
Reis – Esses têm foro privilegiado e, portanto, nunca vão receber uma condenação de primeira instância. Para eles, a regra deve ser um pouco diferente. Eles devem ser afastados quando há o recebimento da denúncia. Por que a diferença? Porque, em tribunais superiores, o recebimento da denúncia é um ato bem mais fundamentado. Além disso, é decidido por um tribunal, não por apenas um magistrado. O recebimento da denúncia pela corte só é feito mediante a existência de provas de um ilícito e de elementos que liguem esses indícios ao acusado. É o suficiente para acender o sinal amarelo. Vale lembrar que há muitos parlamentares processados, mas o Supremo Tribunal Federal jamais condenou ninguém.
ÉPOCA – Durante o período de campanha, a Justiça consegue ser rápida. Pedidos de direito de resposta em propaganda eleitoral, por exemplo, são decididos em poucas horas. Por que não há a mesma agilidade após a eleição?
Reis – Deveria haver, mas há uma explicação legal para isso. A legislação estabelece uma prioridade para ações eleitorais durante o período eleitoral. Após a votação, no entanto, acaba a prioridade. Então, os processos que não foram resolvidos até a data da votação perdem a prioridade sobre os demais. Eu entendo que isso deveria ser mudado. A prioridade do processo eleitoral deveria valer até a conclusão da ação, independentemente da data da eleição.
ÉPOCA – A campanha optou por coletar assinaturas. Não seria mais fácil pedir para um deputado fazer o projeto?
Reis – Não seria difícil arrumar o apoio de parlamentares para apresentar o projeto. O que não se consegue é fazer com que o Parlamento vote a matéria. Há projetos sobre o tema que estão parados há dois anos. Com apoio popular, a esperança é que o Congresso se sensibilize para votar logo. Queremos que a lei da vida pregressa esteja em vigor já na próxima eleição.
ÉPOCA – A exigência de 1% de assinaturas do eleitorado para a apresentação de um projeto de lei de iniciativa popular é alta, baixa ou adequada?
Reis – Parece adequada. O problema é que o Congresso só aceita assinaturas no papel, o que torna impossível a conferência. Quem vai checar? Hoje, com os recursos tecnológicos disponíveis, já poderiam aceitar como válidas as adesões feitas pela internet. Para evitar fraudes, basta fazer convênios com provedores confiáveis e aplicar alguns mecanismos tecnológicos para impedir identificações falsas ou repetidas.
Revista Época - 17/08/2009 (pg. 54)
Em campanha por 1,3 milhão de assinaturas, o juiz quer vetar candidatos com condenação criminal
Há dez anos, um grupo de entidades juntou 1 milhão de assinaturas (1% do eleitorado) a favor de uma lei mais severa sobre compra de votos. Foi a primeira lei de iniciativa popular levada ao Congresso. Aprovada em menos de 40 dias, virou o principal instrumento de combate à corrupção eleitoral. Desde 1999, já serviu para cassar mais de 700 mandatos. Agora, as mesmas entidades querem repetir a dose. Criaram a Campanha Ficha Limpa e já coletaram 1 milhão de assinaturas a favor de uma lei sobre a vida pregressa dos candidatos. A ideia é vetar a candidatura de quem tem condenação na Justiça, mesmo quando ainda cabe recurso. Desta vez, precisam de 1,3 milhão de assinaturas, já que o eleitorado cresceu. O juiz Márlon Reis é um dos coordenadores do movimento. Ele explica os objetivos do projeto.
ENTREVISTA – MÁRLON REIS
QUEM É
Juiz de Direito especializado em questões eleitorais e presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais
O QUE FAZ
É um dos coordenadores do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE). Atualmente, faz curso de doutorado na Universidade de Zaragoza, na Espanha, sobre compra de votos em eleições
ÉPOCA – O que diz o projeto de lei sobre a vida pregressa dos candidatos?
Márlon Reis – Ele estabelece que deve ficar afastado do processo eleitoral o candidato que sofreu condenação em ação penal pública por crimes considerados graves, como homicídio, estupro, narcotráfico, entre outros. Também vale para crimes relacionados à administração pública, como desvio de verbas. Hoje, a pessoa pode ser candidata enquanto não for julgada pelo último tribunal. Pelo projeto, basta sentença de primeira instância para impedir a candidatura.
ÉPOCA – E quais são os crimes pouco graves que permitiriam a candidatura?
Reis – Crimes de menor potencial ofensivo, como desacato, injúria, resistência à ordem de autoridade. Além disso, estão de fora as ações penais privadas, aquelas em que um particular pode mover contra outro. É para evitar que alguém faça isso com a finalidade de tumultuar a candidatura do adversário.
ÉPOCA – Muitas sentenças de primeira instância são reformadas em tribunais superiores. Não é injusto vetar a candidatura de quem ainda pode ser absolvido?
Reis – Eu entendo que a sentença penal de primeira instância deve ter algum significado, não pode ser considerada irrelevante. A sentença deve, no mínimo, acender um sinal amarelo. Pretendemos apenas que ela sirva para limitar uma candidatura. Existe, sim, a possibilidade de ser reformada. Mas há também a possibilidade de uma absolvição ser reformada. E mesmo decisões do último tribunal podem ser incorretas. A mensagem do projeto é a seguinte: se você recebeu uma sentença condenatória, então resolva primeiro sua pendência criminal e depois volte para a vida pública.
”Há muitos parlamentares processados, mas o Supremo
Tribunal Federal nunca condenou ninguém”
ÉPOCA – Mas a restrição à candidatura, por si só, já não é uma pena?
Reis – Não. Isso não é uma punição, é apenas uma restrição. Será uma medida preventiva. A lei vai limitar alguns aspectos da vida política do indivíduo, mas em defesa da sociedade. A Constituição permite ao Congresso editar leis que estabeleçam casos de inelegibilidade. Como o Congresso não fez isso até hoje, estamos mobilizando a sociedade para que cobre do Congresso essa providência.
ÉPOCA – O projeto não fere o princípio da presunção da inocência?
Reis – Ninguém pode ser juiz se tiver ocorrências em sua vida pregressa. Ninguém pode ser vigia se tiver problemas no passado, pois a Polícia Federal organiza um cadastro dos vigias e elimina quem tem condenação em qualquer instância. A regra, aliás, serve para todo o setor público. Por que com os políticos deveria ser diferente? Por que político pode ter ficha suja? O princípio da presunção da inocência serve para que o acusado não receba uma pena em caráter definitivo antes de ser julgado. Ele se aplica no Direito Penal, mas não no âmbito administrativo. Se fosse aplicar ao extremo o princípio da presunção da inocência, poderíamos ter uma pessoa condenada em duas instâncias por narcotráfico passando num concurso da Polícia Federal. Mas isso não acontece, é lógico. A PF elimina antes.
ÉPOCA – Quem será atingido?
Reis – Acho que, principalmente, os prefeitos de pequenas cidades que desviaram verbas. Isso porque, nos pequenos municípios, os prefeitos deixam de ser meros gestores e atuam como ordenadores de despesas. Então eles são identificados nos processos judiciais.
ÉPOCA – E os deputados federais, senadores, governadores?
Reis – Esses têm foro privilegiado e, portanto, nunca vão receber uma condenação de primeira instância. Para eles, a regra deve ser um pouco diferente. Eles devem ser afastados quando há o recebimento da denúncia. Por que a diferença? Porque, em tribunais superiores, o recebimento da denúncia é um ato bem mais fundamentado. Além disso, é decidido por um tribunal, não por apenas um magistrado. O recebimento da denúncia pela corte só é feito mediante a existência de provas de um ilícito e de elementos que liguem esses indícios ao acusado. É o suficiente para acender o sinal amarelo. Vale lembrar que há muitos parlamentares processados, mas o Supremo Tribunal Federal jamais condenou ninguém.
ÉPOCA – Durante o período de campanha, a Justiça consegue ser rápida. Pedidos de direito de resposta em propaganda eleitoral, por exemplo, são decididos em poucas horas. Por que não há a mesma agilidade após a eleição?
Reis – Deveria haver, mas há uma explicação legal para isso. A legislação estabelece uma prioridade para ações eleitorais durante o período eleitoral. Após a votação, no entanto, acaba a prioridade. Então, os processos que não foram resolvidos até a data da votação perdem a prioridade sobre os demais. Eu entendo que isso deveria ser mudado. A prioridade do processo eleitoral deveria valer até a conclusão da ação, independentemente da data da eleição.
ÉPOCA – A campanha optou por coletar assinaturas. Não seria mais fácil pedir para um deputado fazer o projeto?
Reis – Não seria difícil arrumar o apoio de parlamentares para apresentar o projeto. O que não se consegue é fazer com que o Parlamento vote a matéria. Há projetos sobre o tema que estão parados há dois anos. Com apoio popular, a esperança é que o Congresso se sensibilize para votar logo. Queremos que a lei da vida pregressa esteja em vigor já na próxima eleição.
ÉPOCA – A exigência de 1% de assinaturas do eleitorado para a apresentação de um projeto de lei de iniciativa popular é alta, baixa ou adequada?
Reis – Parece adequada. O problema é que o Congresso só aceita assinaturas no papel, o que torna impossível a conferência. Quem vai checar? Hoje, com os recursos tecnológicos disponíveis, já poderiam aceitar como válidas as adesões feitas pela internet. Para evitar fraudes, basta fazer convênios com provedores confiáveis e aplicar alguns mecanismos tecnológicos para impedir identificações falsas ou repetidas.
domingo, 16 de agosto de 2009
A Campanha Ficha Limpa - do site Congresso em Foco
Márlon Reis*
O Brasil tem acompanhado o desenrolar de uma bela experiência de mobilização social que busca apontar caminhos para a restauração da credibilidade das nossas instituições democráticas.
Tocada por 42 organizações da sociedade civil brasileira – organizadas sob a rede denominada Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) – a Campanha Ficha Limpa já conquistou o envolvimento de um milhão de brasileiros e continuará crescendo a passos largos até atingir as 1,3 milhão de assinaturas de que necessita para sustentar a apresentação de um novo projeto de lei de iniciativa popular ao Congresso Nacional.
Mas do que trata essa mobilização? A Campanha surgiu da necessidade de impulsionar o Parlamento a estabelecer hipóteses de inelegibilidade que levem em conta a vida pregressa, o histórico objetivo dos candidatos. O art. 14, § 9º, da Constituição instituiu o princípio da precaução em matéria eleitoral, concedendo ao Congresso base constitucional para criar inelegibilidades voltadas ao declarado fim de “proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício dos mandatos”.
Isso basta para se ter presente que – em tema de inelegibilidades – por expressa opção do texto constitucional – não se aplica o princípio da presunção de inocência, cujo espectro se dirige exclusivamente à esfera penal. Impera aqui, diversamente, o princípio da precaução.
É lógico que seja assim. A democracia é o primeiro dos bens comuns. Ela é constituída pela força abstrata surgida da aceitação de regras de convívio político por grupos, classes, credos, raças e cores diversos. A democracia se afirma no coletivo, no plural, na diversidade, reclamando por isso a adoção de mecanismos que impeçam o seu desvirtuamento por quaisquer indivíduos. Não há direito individual absoluto que assegure a alguém oportunidades para lesar os direitos fundamentais de toda a sociedade.
A Campanha Ficha Limpa não tem, por outro lado, objetivos moralistas, mas fundamentos filosóficos centrados na ética como estatuto de convivência e na restrição de determinado perfil de candidaturas como estratégia de legitimação do Parlamento e de aprofundamento da experiência democrática.
Daí o nome afirmativo da campanha. Em lugar da expressão jocosa “ficha suja”, preferimos aludir a aspectos afirmativos que ressaltam a imprescindibilidade de selecionarmos mandatários cujo histórico pessoal não indique que representam risco para a sociedade.
Argumenta-se que a lei não deveria restringir candidaturas, que só à população deve ser concedido o direito de optar por quem quer que seja. Se aceitássemos essa linha de raciocínio, teríamos que abolir todas as demais inelegibilidades, como os que hoje já afetam os parentes e cônjuges de titulares de cargos eletivos e os que tiveram suas contas rejeitadas pelos órgãos competentes.
As inelegibilidades têm todas elas esse sentido de proteção do futuro mandato ou do próprio processo eleitoral. Quando se alija do pleito alguém que incorre em uma vedação abstratamente definida em lei, não se viola direitos individuais. O que se dá é a afirmação do direito de todos a um governo honesto e eficiente, que encontre na vontade do povo a base para a sua autoridade.
Quando se admite que participe da disputa quem ostenta condenações por crimes como de tráfico de drogas, desvio de verbas da saúde ou da educação, homicídio, estupro ou roubo está-se aceitando uma eleição em que um dos candidatos certamente não disputará com os outros em condições de igualdade. Em lugar da propaganda lícita, ele se valerá da concessão de benesses e da distribuição de ameaças. Tudo vale em sua campanha, menos perder.
Não há obstáculo constitucional, político ou ético a impedir que preventivamente sejam excluídas dos pleitos pessoas que já ostentem condenações criminais. E não é por considerá-las culpadas, o que só interessa ao juízo criminal, mas pelo fato objetivo de possuírem uma grave reprovação de conduta consubstanciada por uma sentença criminal.
Outro aspecto a considerar é o seguinte: a iniciativa popular de projeto de lei não torna inelegível todo e qualquer condenado criminalmente. Pessoas condenadas em ações penais privadas ou por infrações de menor potencial ofensivo, contravenções, atos infracionais ou pela grande maioria dos crimes não serão afetados pela medida. Só aqueles que receberam sentença condenatória por crimes efetivamente graves, devidamente relacionados no projeto e que suscitem a necessidade dessa prevenção especial, é que deverão primeiro resolver suas pendências eleitorais para só depois voltar para a vida política.
O projeto prevê ainda a inelegibilidade dos que renunciam a mandatos para impedir a aplicação de punições e poder participar do pleito seguinte, filme ao qual assistimos muitas vezes em nosso País.
O projeto abre apenas uma exceção no que toca à necessidade de existência de prévia condenação ao considerar inelegíveis os detentores de foro privilegiado que tenham denúncia criminal oficialmente recebida. Essa distinção ocorre porque nesse caso o recebimento da denúncia é um ato praticado por um colegiado de magistrados, que têm que levar em conta pelo menos a existência de prova do crime e de indícios da sua autoria. Além disso, quem já detém foro privilegiado não precisa de novos privilégios.
O prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, um dos grandes juristas que apóiam a iniciativa popular, disse recentemente que num país que tem que fazer campanha para que sejam eleitos apenas candidatos com “ficha limpa” algo de grave está acontecendo.
Em pouco mais de um ano nossa campanha reuniu apoios de grandes organizações sociais e de incontáveis cidadãos e cidadãs. Todos os dias novas forças sociais somam-se aos que se esforçam para levar ao Congresso esse projeto de lei que já nasceu vitorioso por haver propiciado a muita gente a reflexão básica sobre esse aspecto tão elementar da democracia que é a consideração do histórico pessoal dos candidatos.
*Juiz de Direito no Maranhão, Presidente da Abramppe – Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais e membro do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
O Brasil tem acompanhado o desenrolar de uma bela experiência de mobilização social que busca apontar caminhos para a restauração da credibilidade das nossas instituições democráticas.
Tocada por 42 organizações da sociedade civil brasileira – organizadas sob a rede denominada Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) – a Campanha Ficha Limpa já conquistou o envolvimento de um milhão de brasileiros e continuará crescendo a passos largos até atingir as 1,3 milhão de assinaturas de que necessita para sustentar a apresentação de um novo projeto de lei de iniciativa popular ao Congresso Nacional.
Mas do que trata essa mobilização? A Campanha surgiu da necessidade de impulsionar o Parlamento a estabelecer hipóteses de inelegibilidade que levem em conta a vida pregressa, o histórico objetivo dos candidatos. O art. 14, § 9º, da Constituição instituiu o princípio da precaução em matéria eleitoral, concedendo ao Congresso base constitucional para criar inelegibilidades voltadas ao declarado fim de “proteger a probidade administrativa e a moralidade para o exercício dos mandatos”.
Isso basta para se ter presente que – em tema de inelegibilidades – por expressa opção do texto constitucional – não se aplica o princípio da presunção de inocência, cujo espectro se dirige exclusivamente à esfera penal. Impera aqui, diversamente, o princípio da precaução.
É lógico que seja assim. A democracia é o primeiro dos bens comuns. Ela é constituída pela força abstrata surgida da aceitação de regras de convívio político por grupos, classes, credos, raças e cores diversos. A democracia se afirma no coletivo, no plural, na diversidade, reclamando por isso a adoção de mecanismos que impeçam o seu desvirtuamento por quaisquer indivíduos. Não há direito individual absoluto que assegure a alguém oportunidades para lesar os direitos fundamentais de toda a sociedade.
A Campanha Ficha Limpa não tem, por outro lado, objetivos moralistas, mas fundamentos filosóficos centrados na ética como estatuto de convivência e na restrição de determinado perfil de candidaturas como estratégia de legitimação do Parlamento e de aprofundamento da experiência democrática.
Daí o nome afirmativo da campanha. Em lugar da expressão jocosa “ficha suja”, preferimos aludir a aspectos afirmativos que ressaltam a imprescindibilidade de selecionarmos mandatários cujo histórico pessoal não indique que representam risco para a sociedade.
Argumenta-se que a lei não deveria restringir candidaturas, que só à população deve ser concedido o direito de optar por quem quer que seja. Se aceitássemos essa linha de raciocínio, teríamos que abolir todas as demais inelegibilidades, como os que hoje já afetam os parentes e cônjuges de titulares de cargos eletivos e os que tiveram suas contas rejeitadas pelos órgãos competentes.
As inelegibilidades têm todas elas esse sentido de proteção do futuro mandato ou do próprio processo eleitoral. Quando se alija do pleito alguém que incorre em uma vedação abstratamente definida em lei, não se viola direitos individuais. O que se dá é a afirmação do direito de todos a um governo honesto e eficiente, que encontre na vontade do povo a base para a sua autoridade.
Quando se admite que participe da disputa quem ostenta condenações por crimes como de tráfico de drogas, desvio de verbas da saúde ou da educação, homicídio, estupro ou roubo está-se aceitando uma eleição em que um dos candidatos certamente não disputará com os outros em condições de igualdade. Em lugar da propaganda lícita, ele se valerá da concessão de benesses e da distribuição de ameaças. Tudo vale em sua campanha, menos perder.
Não há obstáculo constitucional, político ou ético a impedir que preventivamente sejam excluídas dos pleitos pessoas que já ostentem condenações criminais. E não é por considerá-las culpadas, o que só interessa ao juízo criminal, mas pelo fato objetivo de possuírem uma grave reprovação de conduta consubstanciada por uma sentença criminal.
Outro aspecto a considerar é o seguinte: a iniciativa popular de projeto de lei não torna inelegível todo e qualquer condenado criminalmente. Pessoas condenadas em ações penais privadas ou por infrações de menor potencial ofensivo, contravenções, atos infracionais ou pela grande maioria dos crimes não serão afetados pela medida. Só aqueles que receberam sentença condenatória por crimes efetivamente graves, devidamente relacionados no projeto e que suscitem a necessidade dessa prevenção especial, é que deverão primeiro resolver suas pendências eleitorais para só depois voltar para a vida política.
O projeto prevê ainda a inelegibilidade dos que renunciam a mandatos para impedir a aplicação de punições e poder participar do pleito seguinte, filme ao qual assistimos muitas vezes em nosso País.
O projeto abre apenas uma exceção no que toca à necessidade de existência de prévia condenação ao considerar inelegíveis os detentores de foro privilegiado que tenham denúncia criminal oficialmente recebida. Essa distinção ocorre porque nesse caso o recebimento da denúncia é um ato praticado por um colegiado de magistrados, que têm que levar em conta pelo menos a existência de prova do crime e de indícios da sua autoria. Além disso, quem já detém foro privilegiado não precisa de novos privilégios.
O prof. Celso Antônio Bandeira de Mello, um dos grandes juristas que apóiam a iniciativa popular, disse recentemente que num país que tem que fazer campanha para que sejam eleitos apenas candidatos com “ficha limpa” algo de grave está acontecendo.
Em pouco mais de um ano nossa campanha reuniu apoios de grandes organizações sociais e de incontáveis cidadãos e cidadãs. Todos os dias novas forças sociais somam-se aos que se esforçam para levar ao Congresso esse projeto de lei que já nasceu vitorioso por haver propiciado a muita gente a reflexão básica sobre esse aspecto tão elementar da democracia que é a consideração do histórico pessoal dos candidatos.
*Juiz de Direito no Maranhão, Presidente da Abramppe – Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais e membro do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Campanha Ficha Limpa: a consideração objetiva da vida pregressa
Márlon Jacinto Reis*
As eleições de 2006 foram um marco para a luta pela afirmação da moralidade e da probidade para o exercício dos mandatos eletivos como elemento indispensável à democracia.
Vieram dali as mais relevantes decisões – tomadas principalmente no âmbito do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro – que levavam em conta princípios acolhidos pela Constituição para concluir pelo indeferimento de candidaturas sabidamente envolvidas com o uso deletério dos mandatos políticos.
Em 2008 o tema voltou à baila com força redobrada e por muito pouco não se assentou na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral o entendimento de que a Justiça eleitoral pode considerar elementos que marcam o passado dos candidatos como base para a inviabilização de sua pretensão de lançarem-se em uma candidatura.
Em todas essas oportunidades a Justiça eleitoral andou em sintonia com um crescente apelo público pelo afastamento daquelas personagens já reconhecidamente comprometidas com ilícitos que, por sua própria natureza e envergadura, certamente aconselham o afastamento da sua elegibilidade.
Todas essas iniciativas acabaram barradas no âmbito do próprio Poder Judiciário, ao entendimento de que a falta de lei específica impediria o conhecimento da matéria.
A Campanha Ficha Limpa é a ação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) que tem por objetivo justamente ver editada a lei complementar a que se refere o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação que lhe foi concedida pela Emenda n° 4/2004.
Antes dessa modificação, o texto constitucional apenas previa que as inelegibilidades deveriam servir de base para assegurar a legitimidade e normalidade dos pleitos. Em resposta aos graves fatos descobertos em 1993 (a denominada “Máfia do Orçamento”), o próprio Congresso Nacional aprovou a mudança na Constituição para autorizar o legislador complementar a fixar inelegibilidades para a “proteção da moralidade administrativa e da probidade para o exercício dos mandatos, considerada a vida pregressa dos candidatos”.
O atual texto da Lei Complementar n° 64 (Lei de Inelegibilidades) – editada em 1990 – é, por isso, incompatível com o que a Constituição só veio a autorizar quatro anos depois. As premissas e lindes constitucionais eram bem diversos e mais estreitos quando da edição da Lei de Inelegibilidades, ampliando-se posteriormente para abarcar um número mais significativo de hipóteses.
Infelizmente, passados quinze anos desde a emenda constitucional, o Congresso ainda não cumpriu o encargo que lhe foi cometido. Diversos projetos de lei chegaram a ser apresentados, mas todos eles tiveram por destino o fundo das gavetas da Câmara e do Senado, onde dormitam ao aguardo de alguma novidade que faça o Parlamento cumprir o seu papel.
É nesse contexto histórico-político que surge e se desenvolve a Campanha Ficha Limpa. Ela apresenta à sociedade brasileira um projeto de lei de iniciativa popular cujo objeto é justamente a regulamentação do citado dispositivo da Lei Fundamental, tendo como premissa a necessidade de fixação de padrões objetivos.
O projeto não assenta em nenhum momento a possibilidade de os magistrados eleitorais realizarem juízos de valor sobre a conduta dos candidatos. Não deixa abertura para que um juiz ou tribunal eleitoral decida sobre quem deve ser ou não candidato segundo a própria subjetividade dos julgadores.
Contrariamente, o projeto prevê situações objetivas que, acaso verificadas, retirarão temporariamente ao postulante a sua elegibilidade. São todos pré-requisitos que se aperfeiçoam fora do processo de registro da candidatura. Não é o juízo eleitoral quem valora fatos e circunstâncias para decidir se a candidatura deve ou não ser admitida. A circunstância impeditiva já deve ter-se operado em outra oportunidade e por instâncias e juízos distintos.
Se o foro criminal decide em qualquer instância que o acusado abusou sexualmente de crianças, desviou verbas destinadas à saúde ou liderou uma organização de narcotraficantes, ele leva em conta aspectos particulares do caso concreto, julgando segundo silogismos que se baseiam necessariamente na subjetividade do acusado, especialmente no que toca à sua culpabilidade e à intensidade do dolo. Muitas vezes a condenação criminal exige até mesmo considerações sobre “o especial fim de agir” do réu.
Nada disso ocorre no juízo eleitoral ao apreciar-se um pedido de registro. Busca-se apenas verificar a existência objetiva de fatores que a lei considera relevantes a ponto de vedar a candidatura de quem quer que neles incida.
Quando se impede a esposa do prefeito reeleito de candidatar-se ao mesmo cargo, não se discute se ela se aproveitaria ou não dessa condição para benefício da sua candidatura. Isso é presumido pela Constituição. Quando se veda a elegibilidade de quem teve suas contas públicas rejeitadas por vícios insanáveis, não se discute na Justiça eleitoral sobre os motivos do órgão responsável por essa reprovação. Procura-se não a punição do administrador ímprobo ao assentar-lhe essa inelegibilidade, mas a prevenção da sociedade contra candidatos que já possuem sinais de que desservirão ao interesse público.
Seguindo esse mesmo raciocínio, o projeto prevê que a Justiça eleitoral indeferirá o pedido de registro de quantos hajam sido condenados por narcotráfico, racismo, genocídio, desvio de verbas e outros delitos cuja gravidade é por todos desde logo percebida.
Não se trata de analisar se eles são ou não culpados dessa ou daquela conduta, mas de observar a presença de uma circunstância objetiva – a sentença criminal – a recomendar que não estejam entre os postulantes ao mandato eletivo.
Essa é uma das razões pelas quais o princípio da presunção de inocência não se aplica ao tema das inelegibilidades. Como não há aqui juízos de valor sobre a culpa do pretendente ao registro de candidatura, não há que se falar em presumir-se ou não a sua inocência. A decisão do foro eleitoral baseia-se objetivamente na existência da sentença criminal, não subjetivamente na possível culpa do réu.
Com relação aos submetidos a foro definido por prerrogativa de função, o projeto popular considera bastante o recebimento da denúncia por um órgão colegiado. É que aqui a decisão é mais segura, tomada por uma instância plural. Por outra parte muitas das vezes esses processos podem ter até mesmo a sua tramitação suspensa por decisão legislativa. Além disso, quem já detém foro privilegiado não pode pretender, no restante, ser tratado como igual a todos os demais.
Para a definição de uma inelegibilidade basta que a lei repute certa condição objetiva como suficientemente grave a ponto de fazer valer a necessidade da adoção de uma medida restritiva. Analisada em separado, toda inelegibilidade tem necessariamente esse condão. O grupo social pode definir através da lei complementar o perfil daqueles que poderão apresentar-se como candidatos.
De outra parte, é evidente a conveniência de uma lei que trate objetivamente dessas circunstâncias, evitando imprecisões e juízos discricionários que convertam os pleitos em uma aventura imprevisível.
Essa é uma das razões pelas quais o projeto de lei de iniciativa popular apresentado pelo MCCE através da Campanha Ficha Limpa vem ganhando cada vez mais adeptos, tendo alcançado nos últimos dias a impressionante soma de um milhão de apoiadores.
Mais detalhes sobre o projeto, inclusive o formulário para sua subscrição, podem ser encontrados no site www.mcce.org.br.
*Márlon Jacinto Reis é juiz eleitoral e membro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
congressoemfoco.ig.com.br/noticia.asp?cod_canal=4&cod_publicacao=29293
As eleições de 2006 foram um marco para a luta pela afirmação da moralidade e da probidade para o exercício dos mandatos eletivos como elemento indispensável à democracia.
Vieram dali as mais relevantes decisões – tomadas principalmente no âmbito do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro – que levavam em conta princípios acolhidos pela Constituição para concluir pelo indeferimento de candidaturas sabidamente envolvidas com o uso deletério dos mandatos políticos.
Em 2008 o tema voltou à baila com força redobrada e por muito pouco não se assentou na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral o entendimento de que a Justiça eleitoral pode considerar elementos que marcam o passado dos candidatos como base para a inviabilização de sua pretensão de lançarem-se em uma candidatura.
Em todas essas oportunidades a Justiça eleitoral andou em sintonia com um crescente apelo público pelo afastamento daquelas personagens já reconhecidamente comprometidas com ilícitos que, por sua própria natureza e envergadura, certamente aconselham o afastamento da sua elegibilidade.
Todas essas iniciativas acabaram barradas no âmbito do próprio Poder Judiciário, ao entendimento de que a falta de lei específica impediria o conhecimento da matéria.
A Campanha Ficha Limpa é a ação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) que tem por objetivo justamente ver editada a lei complementar a que se refere o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação que lhe foi concedida pela Emenda n° 4/2004.
Antes dessa modificação, o texto constitucional apenas previa que as inelegibilidades deveriam servir de base para assegurar a legitimidade e normalidade dos pleitos. Em resposta aos graves fatos descobertos em 1993 (a denominada “Máfia do Orçamento”), o próprio Congresso Nacional aprovou a mudança na Constituição para autorizar o legislador complementar a fixar inelegibilidades para a “proteção da moralidade administrativa e da probidade para o exercício dos mandatos, considerada a vida pregressa dos candidatos”.
O atual texto da Lei Complementar n° 64 (Lei de Inelegibilidades) – editada em 1990 – é, por isso, incompatível com o que a Constituição só veio a autorizar quatro anos depois. As premissas e lindes constitucionais eram bem diversos e mais estreitos quando da edição da Lei de Inelegibilidades, ampliando-se posteriormente para abarcar um número mais significativo de hipóteses.
Infelizmente, passados quinze anos desde a emenda constitucional, o Congresso ainda não cumpriu o encargo que lhe foi cometido. Diversos projetos de lei chegaram a ser apresentados, mas todos eles tiveram por destino o fundo das gavetas da Câmara e do Senado, onde dormitam ao aguardo de alguma novidade que faça o Parlamento cumprir o seu papel.
É nesse contexto histórico-político que surge e se desenvolve a Campanha Ficha Limpa. Ela apresenta à sociedade brasileira um projeto de lei de iniciativa popular cujo objeto é justamente a regulamentação do citado dispositivo da Lei Fundamental, tendo como premissa a necessidade de fixação de padrões objetivos.
O projeto não assenta em nenhum momento a possibilidade de os magistrados eleitorais realizarem juízos de valor sobre a conduta dos candidatos. Não deixa abertura para que um juiz ou tribunal eleitoral decida sobre quem deve ser ou não candidato segundo a própria subjetividade dos julgadores.
Contrariamente, o projeto prevê situações objetivas que, acaso verificadas, retirarão temporariamente ao postulante a sua elegibilidade. São todos pré-requisitos que se aperfeiçoam fora do processo de registro da candidatura. Não é o juízo eleitoral quem valora fatos e circunstâncias para decidir se a candidatura deve ou não ser admitida. A circunstância impeditiva já deve ter-se operado em outra oportunidade e por instâncias e juízos distintos.
Se o foro criminal decide em qualquer instância que o acusado abusou sexualmente de crianças, desviou verbas destinadas à saúde ou liderou uma organização de narcotraficantes, ele leva em conta aspectos particulares do caso concreto, julgando segundo silogismos que se baseiam necessariamente na subjetividade do acusado, especialmente no que toca à sua culpabilidade e à intensidade do dolo. Muitas vezes a condenação criminal exige até mesmo considerações sobre “o especial fim de agir” do réu.
Nada disso ocorre no juízo eleitoral ao apreciar-se um pedido de registro. Busca-se apenas verificar a existência objetiva de fatores que a lei considera relevantes a ponto de vedar a candidatura de quem quer que neles incida.
Quando se impede a esposa do prefeito reeleito de candidatar-se ao mesmo cargo, não se discute se ela se aproveitaria ou não dessa condição para benefício da sua candidatura. Isso é presumido pela Constituição. Quando se veda a elegibilidade de quem teve suas contas públicas rejeitadas por vícios insanáveis, não se discute na Justiça eleitoral sobre os motivos do órgão responsável por essa reprovação. Procura-se não a punição do administrador ímprobo ao assentar-lhe essa inelegibilidade, mas a prevenção da sociedade contra candidatos que já possuem sinais de que desservirão ao interesse público.
Seguindo esse mesmo raciocínio, o projeto prevê que a Justiça eleitoral indeferirá o pedido de registro de quantos hajam sido condenados por narcotráfico, racismo, genocídio, desvio de verbas e outros delitos cuja gravidade é por todos desde logo percebida.
Não se trata de analisar se eles são ou não culpados dessa ou daquela conduta, mas de observar a presença de uma circunstância objetiva – a sentença criminal – a recomendar que não estejam entre os postulantes ao mandato eletivo.
Essa é uma das razões pelas quais o princípio da presunção de inocência não se aplica ao tema das inelegibilidades. Como não há aqui juízos de valor sobre a culpa do pretendente ao registro de candidatura, não há que se falar em presumir-se ou não a sua inocência. A decisão do foro eleitoral baseia-se objetivamente na existência da sentença criminal, não subjetivamente na possível culpa do réu.
Com relação aos submetidos a foro definido por prerrogativa de função, o projeto popular considera bastante o recebimento da denúncia por um órgão colegiado. É que aqui a decisão é mais segura, tomada por uma instância plural. Por outra parte muitas das vezes esses processos podem ter até mesmo a sua tramitação suspensa por decisão legislativa. Além disso, quem já detém foro privilegiado não pode pretender, no restante, ser tratado como igual a todos os demais.
Para a definição de uma inelegibilidade basta que a lei repute certa condição objetiva como suficientemente grave a ponto de fazer valer a necessidade da adoção de uma medida restritiva. Analisada em separado, toda inelegibilidade tem necessariamente esse condão. O grupo social pode definir através da lei complementar o perfil daqueles que poderão apresentar-se como candidatos.
De outra parte, é evidente a conveniência de uma lei que trate objetivamente dessas circunstâncias, evitando imprecisões e juízos discricionários que convertam os pleitos em uma aventura imprevisível.
Essa é uma das razões pelas quais o projeto de lei de iniciativa popular apresentado pelo MCCE através da Campanha Ficha Limpa vem ganhando cada vez mais adeptos, tendo alcançado nos últimos dias a impressionante soma de um milhão de apoiadores.
Mais detalhes sobre o projeto, inclusive o formulário para sua subscrição, podem ser encontrados no site www.mcce.org.br.
*Márlon Jacinto Reis é juiz eleitoral e membro do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
congressoemfoco.ig.com.br/noticia.asp?cod_canal=4&cod_publicacao=29293
Campanha Ficha Limpa: a consideração objetiva da vida pregressa
Márlon Jacinto Reis*
As eleições de 2006 foram um marco para a luta pela afirmação da moralidade e da probidade para o exercício dos mandatos eletivos como elemento indispensável à democracia.
Vieram dali as mais relevantes decisões – tomadas principalmente no âmbito do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro – que levavam em conta princípios acolhidos pela Constituição para concluir pelo indeferimento de candidaturas sabidamente envolvidas com o uso deletério dos mandatos políticos.
Em 2008 o tema voltou à baila com força redobrada e por muito pouco não se assentou na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral o entendimento de que a Justiça eleitoral pode considerar elementos que marcam o passado dos candidatos como base para a inviabilização de sua pretensão de lançarem-se em uma candidatura.
Em todas essas oportunidades a Justiça eleitoral andou em sintonia com um crescente apelo público pelo afastamento daquelas personagens já reconhecidamente comprometidas com ilícitos que, por sua própria natureza e envergadura, certamente aconselham o afastamento da sua elegibilidade.
Todas essas iniciativas acabaram barradas no âmbito do próprio Poder Judiciário, ao entendimento de que a falta de lei específica impediria o conhecimento da matéria.
A Campanha Ficha Limpa é a ação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) que tem por objetivo justamente ver editada a lei complementar a que se refere o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação que lhe foi concedida pela Emenda n° 4/2004.
Antes dessa modificação, o texto constitucional apenas previa que as inelegibilidades deveriam servir de base para assegurar a legitimidade e normalidade dos pleitos. Em resposta aos graves fatos descobertos em 1993 (a denominada “Máfia do Orçamento”), o próprio Congresso Nacional aprovou a mudança na Constituição para autorizar o legislador complementar a fixar inelegibilidades para a “proteção da moralidade administrativa e da probidade para o exercício dos mandatos, considerada a vida pregressa dos candidatos”.
O atual texto da Lei Complementar n° 64 (Lei de Inelegibilidades) – editada em 1990 – é, por isso, incompatível com o que a Constituição só veio a autorizar quatro anos depois. As premissas e lindes constitucionais eram bem diversos e mais estreitos quando da edição da Lei de Inelegibilidades, ampliando-se posteriormente para abarcar um número mais significativo de hipóteses.
Infelizmente, passados quinze anos desde a emenda constitucional, o Congresso ainda não cumpriu o encargo que lhe foi cometido. Diversos projetos de lei chegaram a ser apresentados, mas todos eles tiveram por destino o fundo das gavetas da Câmara e do Senado, onde dormitam ao aguardo de alguma novidade que faça o Parlamento cumprir o seu papel.
É nesse contexto histórico-político que surge e se desenvolve a Campanha Ficha Limpa. Ela apresenta à sociedade brasileira um projeto de lei de iniciativa popular cujo objeto é justamente a regulamentação do citado dispositivo da Lei Fundamental, tendo como premissa a necessidade de fixação de padrões objetivos.
O projeto não assenta em nenhum momento a possibilidade de os magistrados eleitorais realizarem juízos de valor sobre a conduta dos candidatos. Não deixa abertura para que um juiz ou tribunal eleitoral decida sobre quem deve ser ou não candidato segundo a própria subjetividade dos julgadores.
Contrariamente, o projeto prevê situações objetivas que, acaso verificadas, retirarão temporariamente ao postulante a sua elegibilidade. São todos pré-requisitos que se aperfeiçoam fora do processo de registro da candidatura. Não é o juízo eleitoral quem valora fatos e circunstâncias para decidir se a candidatura deve ou não ser admitida. A circunstância impeditiva já deve ter-se operado em outra oportunidade e por instâncias e juízos distintos.
Se o foro criminal decide em qualquer instância que o acusado abusou sexualmente de crianças, desviou verbas destinadas à saúde ou liderou uma organização de narcotraficantes, ele leva em conta aspectos particulares do caso concreto, julgando segundo silogismos que se baseiam necessariamente na subjetividade do acusado, especialmente no que toca à sua culpabilidade e à intensidade do dolo. Muitas vezes a condenação criminal exige até mesmo considerações sobre “o especial fim de agir” do réu.
Nada disso ocorre no juízo eleitoral ao apreciar-se um pedido de registro. Busca-se apenas verificar a existência objetiva de fatores que a lei considera relevantes a ponto de vedar a candidatura de quem quer que neles incida.
Quando se impede a esposa do prefeito reeleito de candidatar-se ao mesmo cargo, não se discute se ela se aproveitaria ou não dessa condição para benefício da sua candidatura. Isso é presumido pela Constituição. Quando se veda a elegibilidade de quem teve suas contas públicas rejeitadas por vícios insanáveis, não se discute na Justiça eleitoral sobre os motivos do órgão responsável por essa reprovação. Procura-se não a punição do administrador ímprobo ao assentar-lhe essa inelegibilidade, mas a prevenção da sociedade contra candidatos que já possuem sinais de que desservirão ao interesse público.
Seguindo esse mesmo raciocínio, o projeto prevê que a Justiça eleitoral indeferirá o pedido de registro de quantos hajam sido condenados por narcotráfico, racismo, genocídio, desvio de verbas e outros delitos cuja gravidade é por todos desde logo percebida.
Não se trata de analisar se eles são ou não culpados dessa ou daquela conduta, mas de observar a presença de uma circunstância objetiva – a sentença criminal – a recomendar que não estejam entre os postulantes ao mandato eletivo.
Essa é uma das razões pelas quais o princípio da presunção de inocência não se aplica ao tema das inelegibilidades. Como não há aqui juízos de valor sobre a culpa do pretendente ao registro de candidatura, não há que se falar em presumir-se ou não a sua inocência. A decisão do foro eleitoral baseia-se objetivamente na existência da sentença criminal, não subjetivamente na possível culpa do réu.
Com relação aos submetidos a foro definido por prerrogativa de função, o projeto popular considera bastante o recebimento da denúncia por um órgão colegiado. É que aqui a decisão é mais segura, tomada por uma instância plural. Por outra parte muitas das vezes esses processos podem ter até mesmo a sua tramitação suspensa por decisão legislativa. Além disso, quem já detém foro privilegiado não pode pretender, no restante, ser tratado como igual a todos os demais.
Para a definição de uma inelegibilidade basta que a lei repute certa condição objetiva como suficientemente grave a ponto de fazer valer a necessidade da adoção de uma medida restritiva. Analisada em separado, toda inelegibilidade tem necessariamente esse condão. O grupo social pode definir através da lei complementar o perfil daqueles que poderão apresentar-se como candidatos.
De outra parte, é evidente a conveniência de uma lei que trate objetivamente dessas circunstâncias, evitando imprecisões e juízos discricionários que convertam os pleitos em uma aventura imprevisível.
Essa é uma das razões pelas quais o projeto de lei de iniciativa popular apresentado pelo MCCE através da Campanha Ficha Limpa vem ganhando cada vez mais adeptos, tendo alcançado nos últimos dias a impressionante soma de um milhão de apoiadores.
Mais detalhes sobre o projeto, inclusive o formulário para sua subscrição, podem ser encontrados no site www.mcce.org.br.
*Márlon Jacinto Reis é juiz eleitoral e coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
http://congressoemfoco.ig.com.br/noticia.asp?cod_canal=4&cod_publicacao=29293
As eleições de 2006 foram um marco para a luta pela afirmação da moralidade e da probidade para o exercício dos mandatos eletivos como elemento indispensável à democracia.
Vieram dali as mais relevantes decisões – tomadas principalmente no âmbito do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro – que levavam em conta princípios acolhidos pela Constituição para concluir pelo indeferimento de candidaturas sabidamente envolvidas com o uso deletério dos mandatos políticos.
Em 2008 o tema voltou à baila com força redobrada e por muito pouco não se assentou na jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral o entendimento de que a Justiça eleitoral pode considerar elementos que marcam o passado dos candidatos como base para a inviabilização de sua pretensão de lançarem-se em uma candidatura.
Em todas essas oportunidades a Justiça eleitoral andou em sintonia com um crescente apelo público pelo afastamento daquelas personagens já reconhecidamente comprometidas com ilícitos que, por sua própria natureza e envergadura, certamente aconselham o afastamento da sua elegibilidade.
Todas essas iniciativas acabaram barradas no âmbito do próprio Poder Judiciário, ao entendimento de que a falta de lei específica impediria o conhecimento da matéria.
A Campanha Ficha Limpa é a ação do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) que tem por objetivo justamente ver editada a lei complementar a que se refere o § 9º do art. 14 da Constituição, com a redação que lhe foi concedida pela Emenda n° 4/2004.
Antes dessa modificação, o texto constitucional apenas previa que as inelegibilidades deveriam servir de base para assegurar a legitimidade e normalidade dos pleitos. Em resposta aos graves fatos descobertos em 1993 (a denominada “Máfia do Orçamento”), o próprio Congresso Nacional aprovou a mudança na Constituição para autorizar o legislador complementar a fixar inelegibilidades para a “proteção da moralidade administrativa e da probidade para o exercício dos mandatos, considerada a vida pregressa dos candidatos”.
O atual texto da Lei Complementar n° 64 (Lei de Inelegibilidades) – editada em 1990 – é, por isso, incompatível com o que a Constituição só veio a autorizar quatro anos depois. As premissas e lindes constitucionais eram bem diversos e mais estreitos quando da edição da Lei de Inelegibilidades, ampliando-se posteriormente para abarcar um número mais significativo de hipóteses.
Infelizmente, passados quinze anos desde a emenda constitucional, o Congresso ainda não cumpriu o encargo que lhe foi cometido. Diversos projetos de lei chegaram a ser apresentados, mas todos eles tiveram por destino o fundo das gavetas da Câmara e do Senado, onde dormitam ao aguardo de alguma novidade que faça o Parlamento cumprir o seu papel.
É nesse contexto histórico-político que surge e se desenvolve a Campanha Ficha Limpa. Ela apresenta à sociedade brasileira um projeto de lei de iniciativa popular cujo objeto é justamente a regulamentação do citado dispositivo da Lei Fundamental, tendo como premissa a necessidade de fixação de padrões objetivos.
O projeto não assenta em nenhum momento a possibilidade de os magistrados eleitorais realizarem juízos de valor sobre a conduta dos candidatos. Não deixa abertura para que um juiz ou tribunal eleitoral decida sobre quem deve ser ou não candidato segundo a própria subjetividade dos julgadores.
Contrariamente, o projeto prevê situações objetivas que, acaso verificadas, retirarão temporariamente ao postulante a sua elegibilidade. São todos pré-requisitos que se aperfeiçoam fora do processo de registro da candidatura. Não é o juízo eleitoral quem valora fatos e circunstâncias para decidir se a candidatura deve ou não ser admitida. A circunstância impeditiva já deve ter-se operado em outra oportunidade e por instâncias e juízos distintos.
Se o foro criminal decide em qualquer instância que o acusado abusou sexualmente de crianças, desviou verbas destinadas à saúde ou liderou uma organização de narcotraficantes, ele leva em conta aspectos particulares do caso concreto, julgando segundo silogismos que se baseiam necessariamente na subjetividade do acusado, especialmente no que toca à sua culpabilidade e à intensidade do dolo. Muitas vezes a condenação criminal exige até mesmo considerações sobre “o especial fim de agir” do réu.
Nada disso ocorre no juízo eleitoral ao apreciar-se um pedido de registro. Busca-se apenas verificar a existência objetiva de fatores que a lei considera relevantes a ponto de vedar a candidatura de quem quer que neles incida.
Quando se impede a esposa do prefeito reeleito de candidatar-se ao mesmo cargo, não se discute se ela se aproveitaria ou não dessa condição para benefício da sua candidatura. Isso é presumido pela Constituição. Quando se veda a elegibilidade de quem teve suas contas públicas rejeitadas por vícios insanáveis, não se discute na Justiça eleitoral sobre os motivos do órgão responsável por essa reprovação. Procura-se não a punição do administrador ímprobo ao assentar-lhe essa inelegibilidade, mas a prevenção da sociedade contra candidatos que já possuem sinais de que desservirão ao interesse público.
Seguindo esse mesmo raciocínio, o projeto prevê que a Justiça eleitoral indeferirá o pedido de registro de quantos hajam sido condenados por narcotráfico, racismo, genocídio, desvio de verbas e outros delitos cuja gravidade é por todos desde logo percebida.
Não se trata de analisar se eles são ou não culpados dessa ou daquela conduta, mas de observar a presença de uma circunstância objetiva – a sentença criminal – a recomendar que não estejam entre os postulantes ao mandato eletivo.
Essa é uma das razões pelas quais o princípio da presunção de inocência não se aplica ao tema das inelegibilidades. Como não há aqui juízos de valor sobre a culpa do pretendente ao registro de candidatura, não há que se falar em presumir-se ou não a sua inocência. A decisão do foro eleitoral baseia-se objetivamente na existência da sentença criminal, não subjetivamente na possível culpa do réu.
Com relação aos submetidos a foro definido por prerrogativa de função, o projeto popular considera bastante o recebimento da denúncia por um órgão colegiado. É que aqui a decisão é mais segura, tomada por uma instância plural. Por outra parte muitas das vezes esses processos podem ter até mesmo a sua tramitação suspensa por decisão legislativa. Além disso, quem já detém foro privilegiado não pode pretender, no restante, ser tratado como igual a todos os demais.
Para a definição de uma inelegibilidade basta que a lei repute certa condição objetiva como suficientemente grave a ponto de fazer valer a necessidade da adoção de uma medida restritiva. Analisada em separado, toda inelegibilidade tem necessariamente esse condão. O grupo social pode definir através da lei complementar o perfil daqueles que poderão apresentar-se como candidatos.
De outra parte, é evidente a conveniência de uma lei que trate objetivamente dessas circunstâncias, evitando imprecisões e juízos discricionários que convertam os pleitos em uma aventura imprevisível.
Essa é uma das razões pelas quais o projeto de lei de iniciativa popular apresentado pelo MCCE através da Campanha Ficha Limpa vem ganhando cada vez mais adeptos, tendo alcançado nos últimos dias a impressionante soma de um milhão de apoiadores.
Mais detalhes sobre o projeto, inclusive o formulário para sua subscrição, podem ser encontrados no site www.mcce.org.br.
*Márlon Jacinto Reis é juiz eleitoral e coordenador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE).
http://congressoemfoco.ig.com.br/noticia.asp?cod_canal=4&cod_publicacao=29293
terça-feira, 11 de agosto de 2009
Bombou na web - Site do MCCE: 83 mil acessos em três dias
Desde a última sexta-feira, quando o MCCE organizou um ato público divulgando a etapa "300 em 30" da Campanha Ficha Limpa, o site da entidade (http://www.mcce.org.br/) contabilizou mais de 83 mil acessos - demonstrando o grande interesse dos internautas sobre o tema.
Tamanha procura "congestionou" temporariamente o tráfego de dados; em função disso, o site saiu do ar ontem. Hoje seu acesso deve ser restabelecido.
Postado por Campanha Ficha Limpa SP
Tamanha procura "congestionou" temporariamente o tráfego de dados; em função disso, o site saiu do ar ontem. Hoje seu acesso deve ser restabelecido.
Postado por Campanha Ficha Limpa SP
domingo, 9 de agosto de 2009
Artigo - Campanha Ficha Limpa: o estado da arte
Marlon Reis[1]
Um milhão de pessoas já subscreveram o formulário da Campanha Ficha Limpa realizada pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (www.mcce.org.br) para apresentar ao Congresso projeto de lei de iniciativa popular em que se propõe a regulamentação do § 9º do art. 14 da Constituição Federal.
O dispositivo da Lei Fundamental expressamente autoriza a edição de lei complementar criando hipóteses de inelegibilidade que levem em consideração “a vida pregressa dos candidatos” como mecanismo de proteção da “probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato”.
A base constitucional desse preceito autoriza a superação da idéia segundo a qual o princípio da presunção de inocência estaria a impedir a edição de uma lei que considerasse suficiente uma sentença recorrível como critério para o afastamento da candidatura.
Hoje se reconhece que o princípio da não-culpabilidade tem aplicação e reflexos exclusivamente na esfera penal. Não fora assim o patrão não poderia demitir por justa causa o empregado que atentou contra sua vida. Teria que aguardar o julgamento do último recurso interposto pela defesa para só então fazê-lo, talvez 20 anos depois do crime e, quem sabe, de consumado o seu intento.
Definitivo é o exemplo dado pelo juiz federal George Marmelstein. Ele nos fala da pessoa que responde criminalmente por abuso sexual de crianças. Certamente ela não pode cumprir pena antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas a Administração Pública deve recusar sua inscrição para o concurso em que se pretende preencher a vaga de professor em uma creche. São órbitas jurídicas absolutamente distintas.
É por isso que estudiosos do porte de Celso Antônio Bandeira de Mello, Hélio Bicudo, Fábio Konder Comparato, José Jairo Gomes, Aristides Junqueira e João Baptista Herkenhoff, dentre muitos outros de igual prestígio no meio jurídico, têm afirmado a plena possibilidade de a lei complementar fixar parâmetros para as inelegibilidades que não levem em conta o princípio da presunção de inocência. O próprio Ministro da Justiça, Tarso Genro, encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei em cuja justificativa reconhece a inaplicabilidade desse princípio ao tema das inelegibilidades.
Diversos países já restringem a candidatura de pessoas condenadas criminalmente, ainda que estas aguardem o julgamento de recursos. Caso célebre, na Europa, é o da Espanha, que não exige o trânsito em julgado de sentenças relativas a crimes de terrorismo e rebelião para que sobrevenha a inelegibilidade do inculpado.
No nosso caso, o que a Campanha Ficha Limpa prevê é a inelegibilidade de pessoas condenadas por crimes graves – tais como estupro, tráfico de drogas, desvio de verbas e racismo – afastando-os dos pleitos até que resolvam suas pendências criminais. O projeto também confere “tratamento especial” para certa classe de brasileiros, considerando que uma denúncia criminal formalmente acolhida por um coletivo de desembargadores e ministros basta para o afastamento temporário da sua elegibilidade. Trata-se dos detentores do chamado “foro privilegiado”.
Para chegar a essa conclusão aparentemente radical, o MCCE considerou o fato de que dentre os muitos originariamente processados no âmbito do Supremo Tribunal Federal (deputados, senadores, ministros etc.), ninguém jamais foi condenado por aquela Corte de Justiça. Daí que, se o foro privilegiado é uma regalia, pois então que dela sobrevenha alguma conseqüência. Afinal, ser justo é tratar desigualmente os desiguais.
Além dessas hipóteses, o projeto prevê a inelegibilidade de mandatários que renunciaram a seus cargos para escapar de punições e de candidatos que praticaram abuso de poder, compra de votos ou qualquer outra forma de corrupção como meio de vencer o pleito.
Não há brasileiro, salvo uns poucos que se beneficiam diretamente do excessivo liberalismo da legislação atual, que não compreenda a importância e a urgência da adoção dessas medidas.
A Campanha Ficha Limpa não se baseia em argumentos moralistas, mas na identificação de patamares éticos cujo alcance pela sociedade brasileira é condição sine qua non para a reconstrução da prática política em bases republicanas.
Não se trata de fustigar o Congresso – vértice da democracia moderna –, mas, pelo contrário, de promover o seu aperfeiçoamento livrando-o de mazelas que comprometem a sua legitimidade e inspiram inaceitáveis soluções autoritárias.
Faltam ainda 300 mil assinaturas para que o projeto possa chegar ao Parlamento, atingindo o percentual de eleitores exigido pela legislação. A se tirar pela facilidade que nós do MCCE notamos em conseguir subscritores para o projeto de lei, estou certo de que em breve o Congresso terá que se deparar com a necessidade de finalmente definir normas mais claras e rigorosas para a apresentação de candidaturas em nosso País.
A mobilização da sociedade brasileira em favor de candidaturas “ficha limpa” constitui a mais significativa tentativa de promoção de uma reforma política ampla, profunda e – graças à envergadura que atingiu – plenamente alcançável.
Todos podem participar desse momento histórico. Basta acessar o site do Movimento (www.mcce.org.br), baixar o formulário e seguir as orientações ali contidas.
__
Publicado originalmente na Caderno Direito & Justiça (capa) do Jornal O Estado de Minas, edição de 03 de agosto de 2004
[1] Juiz de Direito no Maranhão, presidente da Abramppe – Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais e membro do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
Um milhão de pessoas já subscreveram o formulário da Campanha Ficha Limpa realizada pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (www.mcce.org.br) para apresentar ao Congresso projeto de lei de iniciativa popular em que se propõe a regulamentação do § 9º do art. 14 da Constituição Federal.
O dispositivo da Lei Fundamental expressamente autoriza a edição de lei complementar criando hipóteses de inelegibilidade que levem em consideração “a vida pregressa dos candidatos” como mecanismo de proteção da “probidade administrativa e da moralidade para o exercício do mandato”.
A base constitucional desse preceito autoriza a superação da idéia segundo a qual o princípio da presunção de inocência estaria a impedir a edição de uma lei que considerasse suficiente uma sentença recorrível como critério para o afastamento da candidatura.
Hoje se reconhece que o princípio da não-culpabilidade tem aplicação e reflexos exclusivamente na esfera penal. Não fora assim o patrão não poderia demitir por justa causa o empregado que atentou contra sua vida. Teria que aguardar o julgamento do último recurso interposto pela defesa para só então fazê-lo, talvez 20 anos depois do crime e, quem sabe, de consumado o seu intento.
Definitivo é o exemplo dado pelo juiz federal George Marmelstein. Ele nos fala da pessoa que responde criminalmente por abuso sexual de crianças. Certamente ela não pode cumprir pena antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, mas a Administração Pública deve recusar sua inscrição para o concurso em que se pretende preencher a vaga de professor em uma creche. São órbitas jurídicas absolutamente distintas.
É por isso que estudiosos do porte de Celso Antônio Bandeira de Mello, Hélio Bicudo, Fábio Konder Comparato, José Jairo Gomes, Aristides Junqueira e João Baptista Herkenhoff, dentre muitos outros de igual prestígio no meio jurídico, têm afirmado a plena possibilidade de a lei complementar fixar parâmetros para as inelegibilidades que não levem em conta o princípio da presunção de inocência. O próprio Ministro da Justiça, Tarso Genro, encaminhou ao Congresso Nacional projeto de lei em cuja justificativa reconhece a inaplicabilidade desse princípio ao tema das inelegibilidades.
Diversos países já restringem a candidatura de pessoas condenadas criminalmente, ainda que estas aguardem o julgamento de recursos. Caso célebre, na Europa, é o da Espanha, que não exige o trânsito em julgado de sentenças relativas a crimes de terrorismo e rebelião para que sobrevenha a inelegibilidade do inculpado.
No nosso caso, o que a Campanha Ficha Limpa prevê é a inelegibilidade de pessoas condenadas por crimes graves – tais como estupro, tráfico de drogas, desvio de verbas e racismo – afastando-os dos pleitos até que resolvam suas pendências criminais. O projeto também confere “tratamento especial” para certa classe de brasileiros, considerando que uma denúncia criminal formalmente acolhida por um coletivo de desembargadores e ministros basta para o afastamento temporário da sua elegibilidade. Trata-se dos detentores do chamado “foro privilegiado”.
Para chegar a essa conclusão aparentemente radical, o MCCE considerou o fato de que dentre os muitos originariamente processados no âmbito do Supremo Tribunal Federal (deputados, senadores, ministros etc.), ninguém jamais foi condenado por aquela Corte de Justiça. Daí que, se o foro privilegiado é uma regalia, pois então que dela sobrevenha alguma conseqüência. Afinal, ser justo é tratar desigualmente os desiguais.
Além dessas hipóteses, o projeto prevê a inelegibilidade de mandatários que renunciaram a seus cargos para escapar de punições e de candidatos que praticaram abuso de poder, compra de votos ou qualquer outra forma de corrupção como meio de vencer o pleito.
Não há brasileiro, salvo uns poucos que se beneficiam diretamente do excessivo liberalismo da legislação atual, que não compreenda a importância e a urgência da adoção dessas medidas.
A Campanha Ficha Limpa não se baseia em argumentos moralistas, mas na identificação de patamares éticos cujo alcance pela sociedade brasileira é condição sine qua non para a reconstrução da prática política em bases republicanas.
Não se trata de fustigar o Congresso – vértice da democracia moderna –, mas, pelo contrário, de promover o seu aperfeiçoamento livrando-o de mazelas que comprometem a sua legitimidade e inspiram inaceitáveis soluções autoritárias.
Faltam ainda 300 mil assinaturas para que o projeto possa chegar ao Parlamento, atingindo o percentual de eleitores exigido pela legislação. A se tirar pela facilidade que nós do MCCE notamos em conseguir subscritores para o projeto de lei, estou certo de que em breve o Congresso terá que se deparar com a necessidade de finalmente definir normas mais claras e rigorosas para a apresentação de candidaturas em nosso País.
A mobilização da sociedade brasileira em favor de candidaturas “ficha limpa” constitui a mais significativa tentativa de promoção de uma reforma política ampla, profunda e – graças à envergadura que atingiu – plenamente alcançável.
Todos podem participar desse momento histórico. Basta acessar o site do Movimento (www.mcce.org.br), baixar o formulário e seguir as orientações ali contidas.
__
Publicado originalmente na Caderno Direito & Justiça (capa) do Jornal O Estado de Minas, edição de 03 de agosto de 2004
[1] Juiz de Direito no Maranhão, presidente da Abramppe – Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais e membro do Comitê Nacional do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral.
Do blog Direito Legal: A Campanha Ficha Limpa
Quinta passada estava ouvindo a CBN enquanto resolvia uns pepinos e lá escutei mais alguma coisa sobre a campanha Ficha Limpa. Admito que não estava muito ligada nessa campanha, até que finalmente começaram a vir os questionamentos de estudante de direito convencida: “e a presunção da inocência?”, “e os golpes que a oposição pode dar?”. Bobeira. Hoje o juiz de direito Marlon Jacinto Reis escreveu um texto no jornal para tirar todas as minhas dúvidas que, como podem ver, eram bem primárias. Um dos trechos que mais gostei foi “Hoje se reconhece que o princípio da não culpabilidade tem aplicação e reflexos exclusivamente na esfera penal. Não fora assim, o patrão não poderia demitir por justa causa o empregado que atentou contra sua vida. Teria que aguardar o julgamento do último recurso interposto pela defesa para só então fazê-lo, talvez 20 anos depois do crime e, quem sabe, de consumado o seu intento”.
Me chamou atenção, eu nunca tinha pensado nisso de forma tão simples. Aliás, nunca tinha pensado nisso. Para mim, a presunção da inocência valeria pra tudo. Por exemplo, tenho um defeito enorme de não enxergar bem a maldade nas pessoas. Estou melhorando. Mas sempre me desculpava dizendo “ah, é a presunção da inocência”. Não, não é. É bobice mesmo. E tem que ser superada.
Quanto à oposição tentar qualquer golpe para evitar a candidatura de um sujeito bom partido (olha o trocadilho!) acusando-o de algo, Jacinto Reis informa que a Campanha Ficha Limpa prevê a inelegibilidade somente de pessoas envolvidas em crimes graves como estupro, tráfico de drogas, desvio de verbas e racismo. Ou seja, mais complicado acusar alguém, sem provas, de tais crimes. Fora que o acusador responderia por calúnia, né, uma vez que é livre a expressão sendo vedado o anonimato (Constituição).
Estou convencida de que este projeto de lei, apresentado por iniciativa popular (coisa dificílima de conseguir) será um passo importante para o nosso Brasilzão e suas pizzas. Ainda faltam 300 mil assinaturas e, quem quiser participar, basta acessar o site http://www.mcce.org.br/ e baixar o formulário.
“Ser bueno, pero no tonto; he ahí la cuestión”. da Logosofia
Fonte: http://direitoelegal.wordpress.com/2009/08/03/a-campanha-ficha-limpa/
Me chamou atenção, eu nunca tinha pensado nisso de forma tão simples. Aliás, nunca tinha pensado nisso. Para mim, a presunção da inocência valeria pra tudo. Por exemplo, tenho um defeito enorme de não enxergar bem a maldade nas pessoas. Estou melhorando. Mas sempre me desculpava dizendo “ah, é a presunção da inocência”. Não, não é. É bobice mesmo. E tem que ser superada.
Quanto à oposição tentar qualquer golpe para evitar a candidatura de um sujeito bom partido (olha o trocadilho!) acusando-o de algo, Jacinto Reis informa que a Campanha Ficha Limpa prevê a inelegibilidade somente de pessoas envolvidas em crimes graves como estupro, tráfico de drogas, desvio de verbas e racismo. Ou seja, mais complicado acusar alguém, sem provas, de tais crimes. Fora que o acusador responderia por calúnia, né, uma vez que é livre a expressão sendo vedado o anonimato (Constituição).
Estou convencida de que este projeto de lei, apresentado por iniciativa popular (coisa dificílima de conseguir) será um passo importante para o nosso Brasilzão e suas pizzas. Ainda faltam 300 mil assinaturas e, quem quiser participar, basta acessar o site http://www.mcce.org.br/ e baixar o formulário.
“Ser bueno, pero no tonto; he ahí la cuestión”. da Logosofia
Fonte: http://direitoelegal.wordpress.com/2009/08/03/a-campanha-ficha-limpa/
Sociedade civil construindo melhores quadros em nossa política
Márlon Reis*
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) é uma rede composta por 41 entidades da sociedade civil de abrangência nacional. Seu nascimento guarda relação com a aprovação da Lei n° 9.840/99, fruto de uma iniciativa popular de projeto de lei que reuniu apoios suficientes para dar origem às normas contra a compra de votos que já derrubaram perto de 700 mandatários envolvidos em corrupção desde o ano 2000, dentre eles quatro governadores de Estado.
O MCCE aprendeu muito com essa iniciativa, mas sem dúvida a lição mais importante é a de que a sociedade pode mudar realidades aparentemente invencíveis se souber se mobilizar em torno de ações que tenham um foco comum.
Outra lição que aprendemos é que a luta contra a compra de votos é muito importante, mas precisa ser articulada com a mudança do “perfil” dos candidatos. Não adianta a lei dizer que não se pode corromper o eleitorado se o candidato é ligado a organizações criminosas ou precisa obter o mandato para escapar de punições legais atingindo o foro privilegiado.
Por isso lançamos a Campanha Ficha Limpa, cujo objetivo é reunir as 1,3 milhão de assinaturas necessárias para levar ao Congresso Nacional um novo projeto de lei de iniciativa popular. Desta vez com o objetivo de vetar as candidaturas de pessoas com condenações criminais ou com denúncias acolhidas em julgamentos realizados por tribunais.
O projeto prevê ainda a inelegibilidade de políticos que renunciaram para escapar de cassações e de quem comprou votos ou praticou qualquer forma de abuso. Além disso, a iniciativa pretende agilizar os processos judiciais em matéria eleitoral.
É a própria Constituição quem, no parágrafo 9º do art. 14, concede ao Parlamento a possibilidade de definir inelegibilidades que levem em consideração a vida pregressa dos candidatos.
Já nos deparamos com o primeiro milhão de assinaturas e chegamos a um momento decisivo da campanha em que todo apoio será mais do que bem-vindo. Quanto antes atingirmos o nosso objetivo, mais chances teremos de ver essas normas vigorando já para as eleições do ano que vem.
Para participar, é preciso acessar o site do MCCE (http://www.mcce.org.br/), imprimir o formulário de coleta de assinaturas (infelizmente a nossa legislação é atrasada e não permite a subscrição online) e remeter para o endereço do movimento que está indicado no próprio documento. A campanha mantém também um grupo no Facebook (http://www.facebook.com/home.php#/group.php?gid=91633340771&ref=nf).
Participe!!
*Juiz eleitoral e integrante do MCCE
Fonte: Site Brasília Confidencial
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) é uma rede composta por 41 entidades da sociedade civil de abrangência nacional. Seu nascimento guarda relação com a aprovação da Lei n° 9.840/99, fruto de uma iniciativa popular de projeto de lei que reuniu apoios suficientes para dar origem às normas contra a compra de votos que já derrubaram perto de 700 mandatários envolvidos em corrupção desde o ano 2000, dentre eles quatro governadores de Estado.
O MCCE aprendeu muito com essa iniciativa, mas sem dúvida a lição mais importante é a de que a sociedade pode mudar realidades aparentemente invencíveis se souber se mobilizar em torno de ações que tenham um foco comum.
Outra lição que aprendemos é que a luta contra a compra de votos é muito importante, mas precisa ser articulada com a mudança do “perfil” dos candidatos. Não adianta a lei dizer que não se pode corromper o eleitorado se o candidato é ligado a organizações criminosas ou precisa obter o mandato para escapar de punições legais atingindo o foro privilegiado.
Por isso lançamos a Campanha Ficha Limpa, cujo objetivo é reunir as 1,3 milhão de assinaturas necessárias para levar ao Congresso Nacional um novo projeto de lei de iniciativa popular. Desta vez com o objetivo de vetar as candidaturas de pessoas com condenações criminais ou com denúncias acolhidas em julgamentos realizados por tribunais.
O projeto prevê ainda a inelegibilidade de políticos que renunciaram para escapar de cassações e de quem comprou votos ou praticou qualquer forma de abuso. Além disso, a iniciativa pretende agilizar os processos judiciais em matéria eleitoral.
É a própria Constituição quem, no parágrafo 9º do art. 14, concede ao Parlamento a possibilidade de definir inelegibilidades que levem em consideração a vida pregressa dos candidatos.
Já nos deparamos com o primeiro milhão de assinaturas e chegamos a um momento decisivo da campanha em que todo apoio será mais do que bem-vindo. Quanto antes atingirmos o nosso objetivo, mais chances teremos de ver essas normas vigorando já para as eleições do ano que vem.
Para participar, é preciso acessar o site do MCCE (http://www.mcce.org.br/), imprimir o formulário de coleta de assinaturas (infelizmente a nossa legislação é atrasada e não permite a subscrição online) e remeter para o endereço do movimento que está indicado no próprio documento. A campanha mantém também um grupo no Facebook (http://www.facebook.com/home.php#/group.php?gid=91633340771&ref=nf).
Participe!!
*Juiz eleitoral e integrante do MCCE
Fonte: Site Brasília Confidencial
Etapa 300 em 30 da Campanha Ficha Limpa
O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) fez nesta sexta-feira em São Paulo um ato público da campanha "Ficha Limpa" para mobilizar entidades e cidadãos a conseguir as 300 mil assinaturas para o projeto de lei de iniciativa popular sobre a vida pregressa dos candidatos. Para ser encaminhado ao Congresso, o projeto, que quer impedir que políticos condenados por crimes graves se candidatem, precisa de 1 milhão de assinaturas.
O objetivo do movimento é coletar as 300 mil assinaturas que faltam em 30 dias. De acordo com o juiz eleitoral Marlons Reis, representante da Associação Brasileira dos Magistrados e Promotores Eleitorais (Abramppe), a proposta de mudança à lei complementar 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece casos de inelegibilidade, quer que sejam colocadas "circunstâncias objetivas" para o impedimento de candidaturas.
" É uma atitude preventiva. A campanha quer evitar que políticos condenados por crimes graves se candidatem "
- É uma atitude preventiva. A campanha quer evitar que políticos condenados por crimes graves se candidatem - explicou.
Atualmente o MCCE contabiliza cerca de 1 milhão de assinaturas, coletadas em todas as regiões do país. A Campanha Ficha Limpa foi lançada em abril de 2008, na Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e desde então conta com um apoio crescente de diversos segmentos da sociedade que aderiram à campanha.
Nesse período, o MCCE já recebeu o apoio para a coleta de assinaturas e para a discussão do tema, de igrejas, empresas privadas, universidades, lojas e promotorias eleitorais de todo o país, entre muitos outros segmentos. O envolvimento da sociedade na campanha "Ficha Limpa" se deve ao interesse em melhorar o cenário político e eleitoral do país.
Em agosto do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou recurso da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) pela impugnação das candidaturas de políticos com ficha suja. Pela decisão, ninguém pode ser impedido de disputar eleições enquanto o processo a que responde não tiver sido julgado em última instância.
O julgamento confirmou decisão anterior do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que já havia liberado os candidatos com ficha suja na Justiça para disputar as eleições de outubro.
Fonte: O Globo
O objetivo do movimento é coletar as 300 mil assinaturas que faltam em 30 dias. De acordo com o juiz eleitoral Marlons Reis, representante da Associação Brasileira dos Magistrados e Promotores Eleitorais (Abramppe), a proposta de mudança à lei complementar 64, de 18 de maio de 1990, que estabelece casos de inelegibilidade, quer que sejam colocadas "circunstâncias objetivas" para o impedimento de candidaturas.
" É uma atitude preventiva. A campanha quer evitar que políticos condenados por crimes graves se candidatem "
- É uma atitude preventiva. A campanha quer evitar que políticos condenados por crimes graves se candidatem - explicou.
Atualmente o MCCE contabiliza cerca de 1 milhão de assinaturas, coletadas em todas as regiões do país. A Campanha Ficha Limpa foi lançada em abril de 2008, na Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e desde então conta com um apoio crescente de diversos segmentos da sociedade que aderiram à campanha.
Nesse período, o MCCE já recebeu o apoio para a coleta de assinaturas e para a discussão do tema, de igrejas, empresas privadas, universidades, lojas e promotorias eleitorais de todo o país, entre muitos outros segmentos. O envolvimento da sociedade na campanha "Ficha Limpa" se deve ao interesse em melhorar o cenário político e eleitoral do país.
Em agosto do ano passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou recurso da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) pela impugnação das candidaturas de políticos com ficha suja. Pela decisão, ninguém pode ser impedido de disputar eleições enquanto o processo a que responde não tiver sido julgado em última instância.
O julgamento confirmou decisão anterior do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que já havia liberado os candidatos com ficha suja na Justiça para disputar as eleições de outubro.
Fonte: O Globo
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