Eleitores brasileiros votam sem saber quem patrocina as campanhas
O art. 28, § 4º, da Lei das Eleições, estabelece que os nomes dos doadores de campanha devem ser revelados somente após passadas as eleições.
Antes, porém, de acordo com a mesma lei, acontecem duas prestações de contas preliminares, nos dias 6 de agosto e 6 de setembro.
Por quê a legislação não exige que os nomes dos doadores sejam divulgados já nessas oportunidades?
Lamentavelmente a razão para isso é que as empresas - principais doadoras no Brasil - não querem ver seus nomes publicamente relacionados aos candidatos que financiam, o que pode ser destrutivo em alguns casos para suas imagens.
Os candidatos, por sua vez, preferem muitas vezes não mencionar quem são os seus doadores. Neste caso é a imagem das empresas que pode trazer prejuízos sérios para os objetivos da campanha.
A questão é que o povo brasileiro não tem absolutamente nada a ver com as razões que levaram ao estabelecimento desse “segredo”.
Saber quem são os doadores de campanha é algo elementar para quem está decidindo o destino do seu voto. Afinal, como diz o antigo ditado popular, “quem paga a banda escolhe a música”. É evidente que os financiadores exercerão influência decisiva sobre os destinos dos mandatos eletivos que ajudaram a conquistar.
O que fazer, então?
A decisão de deixar de aplicar esse dispositivo está nas mãos da Justiça Eleitoral.
Não tenho dúvida de que essa norma obscurantista foi revogada pela Lei da Acesso à Informação.
De acordo com o art. 6o , I, da referida lei, “Cabe aos órgãos e entidades do poder público, observadas as normas e procedimentos específicos aplicáveis, assegurar a gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e sua divulgação”.
E segundo o art. 8º, “É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas”.
Além disso, o § 1o, II, do dispositivo citado determina que na divulgação das informações a que ele se refere deverão constar, no mínimo, os registros de quaisquer repasses ou transferências de recursos financeiros.
Essa é a nova lógica estabelecida pela Lei de Acesso à Informação. Todas as normas que com ela colidem estão por consequência revogadas.
Ocultar dos eleitores os nomes dos doadores de campanha é, ademais, grosseiramente ofensivo ao princípio constitucional da publicidade.
Não estamos sob uma ordem totalitária. Não se admite que regras tão elementares como as que asseguram aos cidadãos a ciência de informações imprescindíveis para sustentar a tomada de decisões eleitorais sejam inobservadas em razão de outras visivelmente inconstitucionais e inegavelmente revogadas.
Descabe exigir-se a edição de lei nova para dizer o que a Constituição e a Lei de Acesso à Informação já proclamam: os nomes dos doadores de campanha devem ser divulgados ainda durante os processos eleitorais.
Basta que a Justiça Eleitoral reconheça inaplicável a parte final do § 4º do art. 28 da Lei das Eleições para que a verdade venha à tona quando mais ela pode ser útil: antes do dia das eleições.
Negar publicidade a tais dados só se presta a favorecer ainda mais a corrupção, o abuso do poder econômico e a sujeição antecipada dos mandatos à capacidade financeira de doadores ocultos.
A boa notícia é que o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral - MCCE, a mesma rede de organizações sociais que conquistou a Lei da ficha Limpa, decidiu entrar nesse debate cobrando das instituições encarregadas de gerir e fiscalizar as eleições no Brasil medidas de reconhecimento da transparência que falta às doações de campanha.
Essa é uma causa que, como a própria Ficha Limpa, começa com poucos adeptos. Mas certamente granjeará apoio e mudará uma das faces mais negligenciadas e importantes das eleições brasileiras.
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